Índice
Burgueses e proletários
O socialismo reacionário
a) O socialismo
feudal
b) O socialismo
pequeno-burguês
c) O socialismo
alemão ou socialismo “verdadeiro ”
O socialismo conservador ou burguês
O socialismo e o comunismo crítico-utópicos
A Liga
dos Comunistas , associação
operária internacional
que , nas circunstâncias
de então , só
podia evidentemente ser
secreta , encarregou os abaixo-assinados , no Congresso
que teve lugar
em Londres em
Novembro de 1847, de redigir
um programa
detalhado, simultaneamente teórico e prático , do Partido
e destinado à publicação. Tal é a origem deste Manifesto ,
cujo manuscrito
foi enviado para
Londres, para ser impresso , algumas semanas
antes da Revolução
de Fevereiro . Publicado primeiro
em Alemão ,
houve nesta língua pelo
menos doze edições
diferentes na Alemanha, na Inglaterra e
na América do Norte . Traduzido em
inglês por
Miss Helen Macfarlane, apareceu em 1850,
em Londres, no Red Republican, e, em 1871, teve na América, pelo
menos , três
traduções inglesas. Apareceu em francês , pela primeira vez , em Paris, pouco tempo antes da insurreição
de Junho de 1848, e, recentemente , em
Le Socialiste, de Nova Iorque. Atualmente , prepara-se uma nova
tradução . Fez-se em
Londres uma edição em
polaco , pouco
tempo depois
da primeira edição .
Apareceu em russo, em
Genebra , na década
de 60. Foi também traduzido em dinamarquês pouco
depois da sua
publicação original .
No entanto ,
o Manifesto é um
documento histórico
que já
não temos direito
a modificar . Uma edição
posterior será talvez
precedida de uma introdução que poderá preencher a lacuna entre 1847 e
os nossos dias ;
a atual reimpressão
foi tão inesperada
para nós , que não tivemos
tempo de escrevê-la.
Karl Marx, Friedrich Engels.
Londres, 24 de Junho de 1872
Manifesto do Partido
Comunista [1]
Karl Marx e Friedrich
Engels
Duas conclusões
decorrem desses fatos :
1º) O comunismo
já é reconhecido como
força por
todas as potências da Europa;
2º) É tempo
de os comunistas exporem, à face do mundo inteiro , seu modo de ver , seus fins e suas tendências ,
opondo um manifesto
do próprio partido
à lenda do espectro
do comunismo .
Nas primeiras épocas históricas, verificamos, quase
por toda
parte , uma completa
divisão da sociedade em classes
distintas, uma escala graduada de condições sociais .
Na Roma antiga encontramos patrícios , cavaleiros ,
plebeus , escravos ;
na Idade Média ,
senhores , vassalos ,
mestres , companheiros ,
servos ; e, em
cada uma destas classes ,
gradações especiais .
A sociedade
burguesa moderna , que
brotou das ruínas da sociedade
feudal, não aboliu os antagonismos de classes .
Não fez senão
substituir novas
classes , novas
condições de opressão ,
novas formas
de luta às que
existiram no passado .
Dos servos
da Idade Média
nasceram os burgueses livres das
primeiras cidades ; desta população municipal, saíram os primeiros
elementos da burguesia .
A descoberta
da América, a circunavegação da África ofereceram à burguesia em
assenso um novo
campo de ação .
Os mercados da Índia
e da China, a colonização da América, o comércio
colonial, o incremento dos meios de troca
e, em geral ,
das mercadorias imprimiram um impulso , desconhecido até
então , ao comércio ,
à indústria , à navegação ,
e, por conseguinte ,
desenvolveram rapidamente o elemento revolucionário da sociedade
feudal em decomposição .
A antiga
organização feudal da indústria , em que esta era circunscrita a corporações
fechadas, já não
podia satisfazer às necessidades
que cresciam com
a abertura de novos
mercados . A manufatura
a substituiu. A pequena burguesia industrial
suplantou os mestres das corporações ; a divisão do trabalho entre as diferentes corporações
desapareceu diante da divisão
do trabalho dentro
da própria oficina .
A grande
industria criou o mercado mundial preparado pela descoberta da América. O mercado
mundial acelerou prodigiosamente o desenvolvimento do comércio ,
da navegação , dos meios
de comunicação . Este
desenvolvimento reagiu por sua vez sobre a extensão da indústria ;
e à medida que
a indústria , o comércio ,
a navegação , as vias
férreas se desenvolviam, crescia a burguesia ,
multiplicando seus
capitais e relegando a segundo plano
as classes legadas pela
Idade Média .
Vemos, pois ,
que a própria
burguesia moderna
é o produto de um
longo desenvolvimento ,
de uma série de revoluções
no modo de produção
e de troca .
A burguesia
desempenhou na história um papel eminentemente revolucionário .
A burguesia
despojou de sua auréola
todas as atividades até
então reputadas veneráveis e encaradas com piedoso respeito . Do médico ,
do jurista , do sacerdote ,
do poeta , do sábio
fez seus servidores
assalariados .
A burguesia
rasgou o véu de sentimentalismo
que envolvia as relações
de família e reduziu-as a simples relações
monetárias.
A burguesia
revelou como a brutal
manifestação de força
na Idade Média ,
tão admirada pela
reação , encontra
seu , complemento
natural na ociosidade
mais completa .
Foi a primeira a provar
o que pode realizar
a atividade humana :
criou maravilhas maiores
que as pirâmides
do Egito, os aquedutos romanos , as catedrais
góticas; conduziu expedições que empanaram mesmo
as antigas invasões e as cruzadas .
A burguesia
só pode existir
com a condição
de revolucionar incessantemente
os instrumentos de produção ,
por conseguinte ,
as relações de produção
e, com isso ,
todas as relações sociais .
A conservação inalterada do antigo
modo de produção
constituía, pelo contrário ,
a primeira condição
de existência de todas as classes industriais
anteriores . Essa subversão
contínua da produção ,
esse abalo
constante de todo
o sistema social ,
essa agitação permanente
e essa falta de segurança
distinguem a época burguesa de todas as precedentes.
Dissolvem-se todas as relações sociais antigas e cristalizadas, com
seu cortejo
de concepções e de idéias
secularmente veneradas; as relações que as
substituem tornam-se antiquadas antes de
se ossificar . Tudo
que era
sólido e estável
se esfuma, tudo o que
era sagrado
é profanado, e os homens são obrigados finalmente a encarar com serenidade suas condições
de existência e suas
relações recíprocas.
Impelida pela necessidade
de mercados sempre
novos , a burguesia
invade todo o globo .
Necessita estabelecer-se em toda parte , explorar em toda parte , criar vínculos em toda parte .
A burguesia
submeteu o campo à cidade .
Criou grandes centros
urbanos ; aumentou prodigiosamente
a população das cidades
em relação
à dos campos e, com
isso , arrancou uma grande
parte da população
do embrutecimento da vida rural . Do mesmo modo que subordinou o campo
à cidade , os países
bárbaros ou
semibárbaros aos países civilizados,
subordinou os povos camponeses aos povos burgueses, o Oriente
ao Ocidente .
A burguesia
suprime cada vez
mais a dispersão
dos meios de produção ,
da propriedade e da população .
Aglomerou as populações , centralizou os meios de produção e
concentrou a propriedade em poucas mãos .
A conseqüência necessária
dessas transformações foi a centralização política .
Províncias independentes ,
apenas ligadas
por débeis laços
federativos, possuindo interesses , leis , governos
e tarifas aduaneiras diferentes , foram reunidas em
uma só nação ,
com um
só governo ..
uma só lei ,
um só
interesse nacional
de classe , uma só
barreira alfandegária .
A burguesia ,
durante seu
domínio de classe ,
apenas secular ,
criou forças produtivas mais numerosas e mais
colossais que
todas as gerações passadas
em conjunto .
A subjugação das forças
da natureza , as máquinas ,
a aplicação da química
A Indústria e à agricultura ,
a navegação a vapor ,
as estradas de ferro ,
o telégrafo elétrico ,
a exploração de continentes
inteiros , a canalização
dos rios , populações
inteiras brotando na terra como
por encanto
- que século
anterior teria suspeitado que semelhantes
forças produtivas estivessem adormecidas
no selo do trabalho
social ?
Vemos pois :
os meios de produção
e de troca , sobre
cuja base
se ergue a burguesia , foram gerados no seio da sociedade feudal. Em um certo grau do desenvolvimento desses meios
de produção e de troca ,
as condições em
que a sociedade
feudal produzia e trocava, a organização
feudal da agricultura e da manufatura ,
em suma ,
o regime feudal de propriedade ,
deixaram de corresponder às forças produtivas em
pleno desenvolvimento .
Entravavam a produção em
lugar de impulsioná-la. Transformaram-se
em outras tantas cadeias
que era
preciso despedaçar ;
foram despedaçadas.
Assistimos hoje a um processo semelhante .
As relações burguesas de produção
e de troca , o regime
burguês de propriedade ,
a sociedade burguesa moderna ,
que conjurou gigantescos
meios de produção
e de troca , assemelha-se ao feiticeiro que já não pode controlar as potências
internas que pôs em
movimento com
suas palavras
mágicas . Há dezenas
de anos , a história
da indústria e do comércio
não é senão
a história da revolta
das forças produtivas modernas contra as modernas relações
de produção e de propriedade
que condicionam a existência
da burguesia e seu
domínio . Basta
mencionar as crises
comerciais que ,
repetindo-se periodicamente, ameaçam cada
vez mais
a existência da sociedade
burguesa. Cada crise
destrói regularmente não só uma grande massa de
produtos já
fabricados, mas também
uma grande parte
das próprias forças produtivas já desenvolvidas. Uma epidemia ,
que em
qualquer outra
época teria parecido um
paradoxo , desaba sobre
a sociedade - a epidemia
da superprodução . Subitamente, a sociedade vê-se reconduzida a um
estado de barbaria
momentânea ; dir-se-ia que a fome ou uma guerra
de extermínio cortaram-lhe todos os meios
de subsistência ; a indústria
e o comércio parecem aniquilados. E por quê ? Porque a sociedade possui demasiada civilização ,
demasiados meios
de subsistência , demasiada
indústria , demasiado
comércio . As forças
produtivas de que dispõe não mais
favorecem o desenvolvimento das relações de propriedade
burguesa; pelo contrário ,
tomaram-se por demais
poderosas para essas condições ,
que passam a entravá-las; e todas as vezes que as forças produtivas sociais
se libertam desses entraves , precipitam
na desordem a sociedade
inteira e ameaçam a existência
da propriedade burguesa. 0 sistema burguês
tornou-se demasiado estreito
para conter as riquezas criadas em
seu selo .
De que maneira
consegue a burguesia vencer
essas crises ? De um
lado , pela
destruição violenta
de grande quantidade
de forças produtivas; de outro lado , pela conquista
de novos mercados
e pela exploração
mais intensa
dos antigos . A que
leva isso ?
Ao preparo de crises
mais extensas e mais
destruidoras e à diminuição dos meios de evitá-las.
As armas
que a burguesia
utilizou para abater o feudalismo , voltam-se hoje
contra a própria
burguesia .
A burguesia ,
porém , não
forjou somente as armas
que lhe
darão morte ; produziu também
os homens que
manejarão essas armas - os operários modernos ,
os proletários .
O crescente
emprego de máquinas
e a divisão do trabalho ,
despojando o trabalho do operário
de seu caráter
autônomo , tiraram-lhe todo atrativo .
O produtor passa
a um simples
apêndice da máquina
e só se requer dele a operação mais simples , mais
monótona, mais fácil
de aprender . Desse modo ,
o custo do operário
se reduz, quase exclusivamente ,
aos meios de manutenção
que lhe
são necessários
para viver e perpetuar sua existência . Ora ,
o preço do trabalho [5], como
de toda mercadoria ,
é igual ao custo
de sua produção .
Portanto , à medida
que aumenta
o caráter enfadonho
do trabalho , decrescem os salários .
Mais ainda ,
a quantidade de trabalho
cresce com o desenvolvimento
do maquinismo e da divisão
do trabalho , quer
pelo prolongamento
das horas de labor ,
quer pelo
aumente do trabalho exigido em
um tempo
determinado , pela
aceleração do movimento
das máquinas , etc.
A indústria
moderna transformou a pequena oficina
do antigo mestre
da corporação patriarcal
na grande fábrica
do industrial capitalista .
Massas de operários ,
amontoadas na fábrica , são organizadas militarmente .
Como soldados
da indústria , estão sob
a vigilância de uma hierarquia
completa de oficiais
e suboficiais . Não
são somente escravos da classe
burguesa, do Estado burguês ,
mas também
diariamente, a cada hora ,
escravos da máquina ,
do contramestre e, sobretudo ,
do dono da fábrica .
E esse despotismo
é tanto mais
mesquinho , odioso
e exasperador quanto
maior é a franqueza
com que
proclama ter
no lucro seu objetivo exclusivo .
As camadas
inferiores da classe
média de outrora ,
os pequenos industriais ,
pequenos comerciantes
e pessoas que
possuem rendas , artesãos
e camponeses, caem nas fileiras do proletariado :
uns porque seus
pequenos capitais ,
não lhes
permitindo empregar os processos
da grande indústria ,
sucumbem na concorrência com os grandes capitalistas ; outros
porque sua
habilidade profissional
é depreciada pelos novos
métodos de produção .
Assim , o proletariado
é recrutado em todas as classes da população .
O proletariado
passa por
diferentes fases
de desenvolvimento . Logo
que nasce começa
sua luta
contra a burguesia .
A princípio ,
empenham-se na luta operários
isolados, .mais tarde ,
operários de uma mesma
fábrica , finalmente
operários do mesmo
ramo de indústria ,
de uma mesma localidade ,
contra o burguês
'que os explora diretamente .
Não se limitam a atacar
as relações burguesas de produção ,
atacam os instrumentos de produção :
destróem as mercadorias estrangeiras que lhes fazem concorrência , quebram as máquinas ,
queimam as fábricas e esforçam-se para reconquistar a posição perdida do artesão
da Idade Média .
Nessa fase ,
constitui o proletariado massa disseminada por
todo o país
e dispersa pela
concorrência . Se, por
vezes , os operários
se unem para agir em massa compacta , isto não é ainda o resultado de sua
própria união ,
mas da união
da burguesia que ,
para atingir seus próprios fins políticos ,
é levada a pôr
em movimento
todo o proletariado ,
o que ainda
pode fazer provisoriamente. Durante
essa fase , os proletários
não combatem ainda
seus próprios
inimigos , mas
os inimigos de seus
inimigos , isto
é, os restos da monarquia absoluta , os proprietários
territoriais , os burgueses não industriais ,
os pequenos burgueses. Todo o movimento
histórico está desse modo concentrado
nas mãos da burguesia
e qualquer vitória
alcançada nessas condições é uma vitória burguesa.
Os operários
triunfam às vezes ; mas
é um triunfo
efêmero . O verdadeiro
resultado de suas
lutas não
é o êxito imediato ,
mas a união cada vez mais ampla dos trabalhadores . Esta união é
facilitada pelo crescimento
dos meios de comunicação
criados pela
grande indústria
e que permitem o contato
entre operários
de localidades , diferentes ,
Ora , basta
esse contato
para concentrar as
numerosas lutas locais ,
que têm o mesmo
caráter em
toda parte ,
em uma luta
nacional , em
uma luta de classes .
Mas toda
luta de classes
é uma luta política .
E a união que
os burgueses da Idade Média
levavam séculos a realizar ,
com seus
caminhos vicinais ,
os proletários modernos
realizam em alguns
anos por
meio das vias
férreas.
A organização
do proletariado em
classe e, portanto ,
em partido
político , é incessantemente
destruída pela concorrência
que fazem entre
si os próprios
operários . Mas
renasce sempre , e cada
vez mais
forte , mais
firme , mais
poderosa . Aproveita-se das divisões intestinas da burguesia
para obrigá-la ao reconhecimento
legal de certos
interesses da classe
operária , como ,
por exemplo ,
a lei da jornada
de dez horas
de trabalho na Inglaterra.
De todas as classes que ora enfrentam a burguesia ,
só o proletariado
é uma classe verdadeiramente revolucionária .
As outras classes degeneram e perecem com o desenvolvimento
da grande indústria ;
o proletariado , pelo
contrário , é seu
produto mais
autêntico .
As classes
médias - pequenos
comerciantes , pequenos
fabricantes , artesãos ,
camponeses - combatem a burguesia porque esta compromete sua
existência como
classes médias .
Não são ,
pois , revolucionárias, mas
conservadoras; mais ainda ,
reacionários , pois
pretendem fazer girar para trás a roda da história .
Quando são
revolucionárias é em conseqüência de sua
iminente passagem
para o proletariado ;
não defendem então
seus interesses
atuais , mas
seus interesses
futuros ; abandonam seu
próprio ponto de vista para se colocar no do proletariado .
O lumpen-proletariado, esse produto passivo da putrefação das camadas mais baixas da velha
sociedade , pode ser
arrastado ao movimento por uma revolução
proletária ; todavia ,
suas condições
de vida o predispõem mais a vender-se à reação .
Nas condições
de existência do proletariado
já estão destruídas as da velha sociedade . O proletariado não
tem propriedade ; suas
relações com
a mulher e os filhos
nada têm de comum
com as relações
familiares burguesas. O trabalho
industrial moderno ,
a sujeição do operário pelo
capital , tanto
na Inglaterra como na França, na América
como na Alemanha, despoja
o proletariado de todo
caráter nacional .
As leis , a moral ,
a religião , são
para ele meros preconceitos
burgueses, atrás dos quais se ocultam outros
tantos interesses
burgueses.
Todas as classes que no passado conquistaram o Poder ,
trataram de consolidar a situação
adquirida submetendo a sociedade às suas condições
de apropriação . Os proletários
não podem apoderar-se das forças produtivas sociais
senão abolindo o modo
de apropriação que
era próprio a
estas e, por conseguinte ,
todo modo
de apropriação em
vigor até hoje . Os proletários
nada têm de seu
a salvaguardar ; sua
missão é destruir
todas as garantias e seguranças da propriedade
privada até aqui existentes.
A luta
do proletariado contra
a burguesia , embora
não seja na essência
uma luta nacional ,
reveste-se contudo dessa forma
nos primeiros
tempos . É natural
que o proletariado
de cada país
deva , antes
de tudo , liquidar
sua própria
burguesia .
Esboçando em linhas gerais as fases
do desenvolvimento proletário ,
descrevemos a história da guerra civil , mais ou menos oculta, que
lavra na sociedade
atual , até
a hora em
que essa guerra
explode numa revolução aberta e o proletariado
estabelece sua dominação
pela derrubada
violenta da burguesia .
Todas as sociedades anteriores ,
como vimos, se basearam no antagonismo entre
classes opressoras e classes oprimidas Mas
para oprimir uma classe é preciso poder garantir-lhe condições
tais que
lhe permitam pelo
menos uma existência
de escravo . O servo ,
em plena
servidão , conseguia tornar-se membro da comuna ,
da mesma forma
que o pequeno
burguês , sob
o jugo do absolutismo
feudal, elevava-se à categoria de burguês . O operário moderno , pelo contrário , longe
de se elevar com
o progresso da indústria ,
desce cada vez
mais abaixo
das condições de sua
própria classe .
O trabalhador cai no pauperismo , e este
cresce ainda mais
rapidamente que a população
e a riqueza . É, pois , evidente que a burguesia é incapaz
de continuar desempenhando o papel
de classe dominante
e de impor à sociedade , como lei suprema , as condições
de existência de sua
classe . Não
pode exercer o seu
domínio porque
não pode mais
assegurar a existência
de seu escravo ,
mesmo no quadro
de sua escravidão ,
porque é obrigada
a deixá-lo cair numa tal
situação , que
deve nutri-lo em lugar
de se fazer nutrir por ele . A sociedade não pode mais existir sob sua dominação , o que
quer dizer que a existência
da burguesia é, doravante ,
incompatível com
a da sociedade .
A condição
essencial da existência
e da supremacia da classe
burguesa é a acumulação da riqueza nas mãos dos particulares , a formação
e o crescimento do capital ;
a condição de existência
do capital é o trabalho
assalariado . Este
baseia-se exclusivamente na concorrência dos operários
entre si .
O progresso da indústria ,
de que a burguesia
é agente passivo
o inconsciente , substitui o isolamento
dos operários , resultante
de sua competição, por
sua união revolucionária mediante
a associação . Assim ,
o desenvolvimento da grande indústria
socava o terreno em
que a burguesia
assentou o seu regime
de produção e de apropriação
dos produtos . A burguesia
produz, sobretudo , seus
próprios coveiros .
Sua queda e a
vitória do proletariado
são igualmente
inevitáveis .
II – Proletários
e Comunistas
Os comunistas
não formam um
partido à parte ,
oposto aos outros
partidos operários .
Os comunistas
só se distinguem dos outros partidos
operários em
dois pontos :
1) Nas diversas lutas nacionais dos proletários ,
destacam e fazem prevalecer os interesses comuns
do proletariado , independentemente
da nacionalidade . 2) Nas diferentes fases
por que
passa a luta
entre proletários
e burgueses, representam, sempre , e em toda parte , os interesses
do movimento em
seu conjunto .
Praticamente, os comunistas constituem, pois ,
a fração mais
resoluta dos partidos
operários de cada
país , a fração
que impulsiona as demais ;
teoricamente têm sobre o resto do proletariado
a vantagem de uma compreensão
nítida das condições ,
da marcha e dos fins
gerais do movimento
proletário .
O objetivo imediato dos comunistas
é o mesmo que
o de todos os demais
partidos proletários :
constituição dos proletários
em classe , derrubada da supremacia
burguesa, conquista do poder
político pelo
proletariado .
As concepções
teóricas dos comunistas não se baseiam, de modo
algum , em
idéias ou
princípios inventados ou descobertos por tal ou qual reformador do mundo .
Todas as relações de propriedade
têm passado por
modificações constantes em conseqüência
das contínuas transformações das condições
históricas.
A Revolução
Francesa, por exemplo ,
aboliu a propriedade feudal em proveito da propriedade burguesa.
O que
caracteriza o comunismo não é a abolição da propriedade geral ,
mas a abolição
da propriedade burguesa.
Neste sentido ,
os comunistas podem resumir
sua teoria
nesta fórmula única :
abolição da propriedade
privada .
Censuram-nos, a nós comunistas ,
o querer abolir a propriedade pessoalmente
adquirida, fruto do trabalho
do indivíduo propriedade
que se declara ser
a base de toda
liberdade , de toda
atividade , de toda
independência individual .
A propriedade
pessoal , fruto
do trabalho e do mérito !
Pretende-se falar da propriedade
do pequeno burguês ,
do pequeno camponês ,
forma de propriedade
anterior à propriedade
burguesa? Não precisamos aboli-la, porque o progresso
da indústria já
a aboliu e continua a aboli-la diariamente. Ou
por ventura
pretende-se falar da propriedade
privada atual ,
da propriedade burguesa?
O capital
não é, pois ,
uma força pessoal ;
é uma força social .
Passemos ao trabalho
assalariado .
O preço
médio que
se paga pelo trabalho assalariado
é o mínimo de salário ,
isto é, a soma
dos meios de subsistência
necessária para
que o operário
viva como
operário . Por
conseguinte , o que
o operário obtém com
o seu trabalho
é o estritamente necessário
para mera conservação e reprodução
de sua vida ,
Não queremos de nenhum
modo abolir
essa apropriação pessoal
dos produtos do trabalho ,
indispensável à manutenção
e à reprodução da vida
humana , pois
essa apropriação não
deixa nenhum
lucro líquido que confira poder sobre o trabalho alheio . O que
queremos é suprimir o caráter
miserável desta apropriação
que faz com
que o operário
só viva
para aumentar o capital e só viva na medida em que o exigem
os interesse da classe
dominante .
Na sociedade
burguesa, o trabalho vivo
é sempre um
meio de aumentar
o trabalho acumulado. Na sociedade
comunista , o trabalho
acumulado é sempre um
meio de ampliar ,
enriquecer é melhorar
cada vez
mais a existência
dos trabalhadores .
Na sociedade
burguesa, o passado domina o presente ; na sociedade comunista é o presente que domina o passado .
Na sociedade burguesa, o capital
é independente e pessoal ,
ao passo que
o indivíduo que
trabalha não
tem nem independência
nem personalidade .
É a abolição
de semelhante estado
de coisas que
a burguesia verbera como
a abolição da individualidade
e da liberdade . E com
razão . Porque
se trata efetivamente
de abolir a individualidade
burguesa, a independência burguesa, a liberdade burguesa.
Horrorizai-vos porque
queremos abolir a propriedade
privada . Mas em vossa sociedade a propriedade
privada está abolida para
nove décimos
de seus membros .
E é precisamente porque
não existe para
estes nove
décimos que
ela existe para
vós . Acusai-nos, portanto ,
de querer abolir uma forma de propriedade que só pode existir com a condição de privar de toda propriedade
a imensa maioria
da sociedade .
Confessais, pois ,
que quando
falais do indivíduo , quereis referir-vos
unicamente ao burguês , ao proprietário burguês .
E este indivíduo ,
sem dúvida ,
deve ser suprimido .
O comunismo
não retira
a ninguém o poder
de apropriar-se de sua parte dos produtos
sociais , apenas
suprime o poder de escravizar
o trabalho de outro
por meio
dessa apropriação .
Alega-se ainda que , com a abolição da propriedade privada , toda a atividade
cessaria, uma inércia geral apoderar-se-ia do mundo .
Se isso
fosse verdade , há muito
que a sociedade
burguesa teria sucumbido à ociosidade , pois que os que no regime burguês trabalham não
lucram e os que lucram não trabalham. Toda
a objeção se reduz a essa tautologia :
não haverá mais
o trabalho assalariado
quando não
mais existir capital .
As acusações
feitas contra
o modo comunista
de produção , e de apropriação
dos produtos materiais
têm sido feitas igualmente
contra a produção
e a apropriação dos produtos
do trabalho intelectual .
Assim como
o desaparecimento da propriedade de classe
eqüivale, para o burguês ,
ao desaparecimento de toda produção , também o desaparecimento
da cultura de classe
significa, para ele ,
o desaparecimento de toda a cultura .
A cultura ,
cuja perda
o burguês deplora, é, para
a imensa maioria
dos homens , apenas
um adestramento que
os transforma em máquinas .
A falsa
concepção interesseira
que vos
leva a erigir
em leis
eternas da natureza e da razão as relações
sociais oriundas do vosso
modo de produção
e de propriedade - relações
transitórias que surgem e desaparecem no
curso da produção
- a compartilhais com todas as classes dominantes
já desaparecidas. O que
admitis; para a propriedade
antiga , o que
admitis para a propriedade
feudal, já não
vos atreveis; a admitir
para a propriedade
burguesa.
A família
burguesa desvanece-se naturalmente com o desvanecer de seu complemento ,
e uma e outra desaparecerão com o desaparecimento
do capital .
Acusai-nos de querer
abolir a exploração
das crianças por
seus próprios
pais ? Confessamos este
crime .
Dizeis também
que destruímos os vínculos
mais íntimos ,
substituindo a educação doméstica pela educação social .
E vossa
educação não
é também determinada
pela sociedade ,
pelas condições sociais
em que
educais vossos filhos ,
pela intervenção
direta ou .
indireta da sociedade ,
por meio
de vossas escolas etc.? Os comunistas não
inventaram essa intromissão da sociedade na educação ,
apenas mudam seu
caráter e arrancam a educação à Influência da classe dominante .
As declamações burguesas sobre
a família e a educação ,
sobre os doces
laços que
unem a criança aos pais ,
tomam-se cada vez
mais repugnantes
à medida que
a grande indústria
destrói todos os laços
familiares do proletário
e transforma as crianças em simples objetos de comércio ,
em simples
instrumentos de trabalho .
O casamento burguês é, na realidade , a comunidade das mulheres
casadas. No máximo , poderiam acusar os comunistas
de quererem substituir uma comunidade
de mulheres , hipócrita
e dissimulada, por outra
que seria franca
e oficial . De resto ,
é evidente que ,
com a abolição
das relações de produção
atuais , a comunidade
das mulheres que
deriva dessas relações ,
isto é, a prostituição
oficial e não
oficial desaparecerá.
Os operários
não têm pátria .
Não se lhes
pode tirar aquilo
que não
possuem. Como , porém ,
o proletariado tem por
objetivo conquistar
o poder político
e erigir-se em classe
dirigente da nação ,
tomar-se ele mesmo
a nação , ele
é, nessa medida , nacional ,
embora de nenhum
modo no sentido
burguês da palavra .
As demarcações e os antagonismos nacionais
entre os povos
desaparecem cada vez
mais com
o desenvolvimento da burguesia , com
a liberdade do comércio
e o mercado mundial, com a uniformidade da produção
industrial e as condições
de existência que
lhes correspondem.
A supremacia
do proletariado fará com que tais demarcações e antagonismos
desapareçam ainda mais
depressa . A ação
comum do proletariado ,
pelo menos nos países
civilizados, é uma das primeiras condições
para sua emancipação .
Suprimi a exploração
do homem pelo
homem e tereis suprimido
a exploração de uma nação
por outra .
Será preciso
grande perspicácia
para compreender que as idéias ,
as noções e as concepções ,
numa palavra , que
a consciência do homem
se modifica com toda
mudança sobrevinda em suas condições de vida ,
em suas
relações sociais ,
em sua
existência social ?
"Sem
dúvida , - dir-se-á -, as idéias religiosas, morais ,
filosóficas, políticas , jurídicas, etc.,
modificaram-se no curso do desenvolvimento histórico ,
mas a religião ,
a moral , a filosofia ,
a política , o direito
mantiveram-se sempre através dessas transformações.
"Além
disso, há verdades eternas, como a liberdade ,
a justiça , etc., que
são comuns
a todos os regimes
sociais . Mas
o comunismo quer
abolir estas verdades
eternas, quer abolir
a religião e a moral ,
em lugar
de lhes dar
uma nova forma ,
e isso contradiz todo
o desenvolvimento histórico
anterior ".
A que
se reduz essa acusação ? A história de toda
a sociedade até
nossos dias
consiste no desenvolvimento dos antagonismos de classes ,
antagonismos que
se têm revestido de formas diferentes nas diferentes
épocas ,
A revolução
comunista é a ruptura
mais radical
com as relações
tradicionais de propriedade ; nada de estranho ,
portanto , que
no curso de seu
desenvolvimento , rompa, de modo mais radical , com as
idéias tradicionais.
Vimos acima
que a primeira
fase da revolução
operária é o advento
do proletariado como
classe dominante ,
a conquista da democracia .
O proletariado
utilizará sua supremacia
política para
arrancar pouco
a pouco todo
capital à burguesia ,
para centralizar todos os instrumentos
de produção nas mãos
do Estado , isto
é, do proletariado organizado em classe dominante , e para aumentar , o mais
rapidamente possível , o total das forças
produtivas.
Essas medidas ,
é claro , serão
diferentes nos
vários países .
1 - Expropriação
da propriedade latifundiária
e emprego da renda
da terra em proveito do Estado .
2 - Imposto
fortemente progressivo .
3 - Abolição
do direito de herança .
4 - Confiscação da propriedade de todos
os emigrados e sediciosos .
5 - Centralização do crédito
nas mãos do Estado
por meio
de um banco
nacional com
capital do Estado
e com o monopólio
exclusivo .
6 - Centralização, nas mãos do Estado ,
de todos os meios
de transporte .
7 - Multiplicação
das fábricas e dos instrumentos
de produção pertencentes ao Estado ,
arroteamento das terras incultas e
melhoramento das- terras cultivadas, segundo um plano geral .
8 - Trabalho obrigatório para todos , organização
de exércitos industriais ,
particularmente para
a agricultura .
9 - Combinação
do trabalho agrícola
e industrial , medidas
tendentes a fazer
desaparecer gradualmente
a distinção entre
a cidade e o campo [6].
10 - Educação
pública e gratuita
de todas as crianças , abolição
do trabalho das crianças
nas fábricas , tal
como é praticado hoje .
Combinação da educação
com a produção
material , etc.
Uma vez
desaparecidos os antagonismos de classe no curso do desenvolvimento , e sendo concentrada
toda a produção
propriamente falando nas mãos dos indivíduos associados ,
o poder público
perderá seu caráter
político . O poder
político é o poder
organizado de uma classe para
a opressão de outra .
Se o proletariado , em
sua luta
contra a burguesia ,
se constitui forçosamente em classe , se se converte por uma revolução
em classe dominante e, como
classe dominante ,
destrói violentamente as antigas relações de produção ,
destrói juntamente com
essas relações de produção ,
as condições dos antagonismos
entre as classes
e as classes em
geral e, com
isso , sua
própria dominação
como classe .
III
- Literatura Socialista
e Comunista
1. O Socialismo
Reacionário
(a) O Socialismo Feudal
A guisa
de bandeira , estes
senhores arvoraram a sacola elo mendigo , a fim de atrair o povo ; mas logo que este
acorreu, notou suas costas
ornadas com os velhos
brasões feudais o dispersou-se com grandes gargalhadas irreverentes .
Uma parte
dos legitimistas franceses e a "Jovem
Inglaterra" ofereceram ao mundo esse espetáculo divertido [8].
O que
reprovam à burguesia é mais o ter produzido um proletariado
revolucionário , que
o haver criado
o proletariado em
geral .
Do mesmo modo que o pároco e
o senhor feudal marcharam sempre
de mãos dadas, o socialismo
clerical marcha lado
a lado com
o socialismo feudal.
(b) O Socialismo Pequeno-burguês
(c) O Socialismo Alemão ou o "Verdadeiro "
Socialismo
A literatura
socialista e comunista
da França, nascida sob
a pressão de uma burguesia
dominante , expressão
literária da revolta
contra esse
domínio , foi introduzida na Alemanha quando a burguesia
começava a sua luta
contra o absolutismo
feudal.
Filósofos, semifilósofos e impostores alemães
lançaram-se avidamente sabre essa literatura , mas
esqueceram que , com
a importação da literatura
francesa na Alemanha, não eram
importadas ao mesmo tempo
as condições sociais
da França. Nas condições alemães , a literatura
francesa perdeu toda significação prática imediata e
tomou um caráter
puramente literário .
Aparecia apenas como
especulação ociosa
sobre a realização
da natureza humana .
Por isso ,
as reivindicações da primeira revolução francesa só
eram, para os filósofos alemães
do século XVIII, as reivindicações da
"razão prática "
em geral ;
e a manifestação . da vontade dos burgueses revolucionários
da França não expressava a seus olhos , senão as leis
da vontade pura ,
da vontade tal
como deve ser ,
da vontade verdadeiramente humana .
O trabalho
dos literatos alemães
limitou-se a colocar as idéias
francesas em harmonia
com a sua
velha consciência
filosófica, ou antes
a apropriar-se das idéias francesas sem abandonar seu próprio ponto
de vista filosófico.
Apropriaram-se delas como se assimila uma língua
estrangeira : pela
tradução .
Sabe-se que
os monges recobriam os manuscritos das obras
clássicas da antigüidade pagã com
absurdas lendas sabre
santos católicos .
Os literatos alemães
agiram em sentido
inverso a respeito da literatura
francesa profana . Introduziram suas insanidades filosóficas no original
francês . Por
exemplo , sob
a crítica francesa das funções do dinheiro ,
escreveram da "alienação humana "; sob
a crítica francesa do Estado burguês ,
escreveram "eliminação do poder da universalidade abstrata ",
e assim por
diante .
A esta interpolação
da fraseologia filosófica nas teorias francesas deram o nome
de "filosofia da ação ",
"verdadeiro socialismo ",
"ciência alemã do socialismo " "justificação
filosófica do socialismo " etc.
Desse modo ,
emascularam completamente a literatura socialista
e comunista francesa. E como nas mãos
dos alemães essa literatura
deixou de ser a expressão
da luta de uma classe
contra outra ,
eles se felicitaram por
ter-se elevado acima
da "estreiteza francesa e ter defendido não verdadeiras necessidades ,
mas a "necessidade
do verdadeiro "; não os interesses
do proletário , mas
os interesses do ser
humano , do homem
em geral ,
do homem que
não pertence
a nenhuma classe nem
a realidade alguma e que
só existe no céu
brumoso da fantasia
filosófica.
A luta
da burguesia alemã e especialmente da burguesia
prussiana contra
os feudais e a monarquia absoluta , numa palavra , o movimento
liberal , tornou-se mais
sério .
Desse modo ,
apresentou-se ao verdadeiro socialismo a tão
desejada oportunidade de contrapor
ao movimento Político
as reivindicações socialistas . Pôde lançar os anátemas
tradicionais contra o liberalismo , o regime
representativo, a concorrência burguesa,
a liberdade burguesa de imprensa , o direito
burguês , a liberdade
e a igualdade burguesas; pôde pregar às massas que nada tinham
a ganhar , mas ,
pelo contrário ,
tudo a perder
nesse movimento burguês .
O socialismo alemão
esqueceu, muito a propósito ,
que a crítica
francesa, da qual era
o eco monótono ,
pressupunha a sociedade burguesa moderna com as condições materiais
de existência que
lhe correspondem e uma constituição política
adequada precisamente as coisas que , na
Alemanha, se tratava ainda de conquistar .
Juntou sua
hipocrisia adocicada aos tiros e às chicotadas
com que
esses mesmos
governos respondiam aos levantes dos operários
alemães .
Se o verdadeiro
socialismo se tomou assim
uma arma nas mãos
dos governos contra
a burguesia alemã, representava, além disso, diretamente
um interesse
reacionário , o interesse
da pequena burguesia
alemã. A classe dos pequenos
burgueses, legada pelo
século XVI, e desde
então renascendo sem
cessar sob formas diversas, constitui na Alemanha li verdadeira base social do regime estabelecido.
Mantê-la é manter
na Alemanha o regime estabelecido. A supremacia industrial
e política da burguesia
ameaça a pequena
burguesia de destruição
certa , de um
lado , pela
concentração dos capitais ,
de outro , pelo
desenvolvimento ele
um proletariado
revolucionário . O verdadeiro
socialismo pareceu aos pequenos burgueses como
uma arma capaz
ele aniquilar
esses dois Inimigos . Propagou-se como
uma epidemia .
A roupagem
tecida com
os fios Imateriais
da especulação , bordada
com as flores
da retórica e banhada
de orvalho sentimental ,
essa roupagem na qual
os socialistas alemães
envolveram o miserável esqueleto das suas
"verdades eternas", não fez senão ativar a venda de sua mercadoria entre tal público .
Proclamou que a nação
alemã era a nação
tipo e o filisteu
alemão , o homem
tipo . A todas as infâmias
desse homem tipo
deu um sentido
oculto , um
sentido superior
e socialista , que
as tornava exatamente o contrário do que
eram. Foi conseqüente até o fim ,
levantando-se contra a tendência "brutalmente
destruidora" do comunismo ,
declarando que pairava imparcialmente acima
de todas as lutas de classes . Com
poucas exceções , todas as pretensas;
publicações socialistas ou comunistas que circulam na Alemanha pertencem a esta imunda e enervante literatura [10].
2. O Socialismo
Conservador ou
Burguês
Uma parte
da burguesia procura
remediar os males
sociais com
o fim de consolidar
a sociedade burguesa.
Nessa categoria
enfileiram-se os economistas , os filantropos , os humanitários ,
os que se ocupam em
melhorar a sorte
da classe operária ,
os organizadores de beneficências ,
os protetores dos animais ,
os fundadores das sociedades
de temperança , enfim
os reformadores de gabinete
de toda categoria .
Chegou-se até a elaborar
esse socialismo
burguês em
sistemas completos .
Os socialistas
burgueses querem as condições de vida ela sociedade moderna sem as lutas e
os perigos que
dela decorrem fatalmente . Querem a sociedade atual , mas eliminando os elementos
que a revolucionam e a dissolvem. Querem
a burguesia sem
o proletariado . Como
é natural , a burguesia
concebe o mundo em
que domina como
o melhor dos mundos .
O socialismo burguês
elabora em um
sistema mais
ou menos
completo essa concepção
consoladora. Quando convida o proletariado a realizar esses sistemas
e entrar na nova
Jerusalém, no fundo o que pretende é induzi-lo a manter-se na sociedade
atual , desembaraçando-se, porém , do ódio que ele vota a essa sociedade .
Uma outra
forma desse socialismo ,
menos sistemática ,
porém mais
prática , procura
fazer com que os operários
se afastem de qualquer movimento revolucionário ,
demonstrando-lhes que não será tal ou qual mudança política ,
mas simplesmente
uma transformação das condições de vida material
das relações econômicas; que poderá ser proveitosa para eles . Notai que ,
por transformação das condições da vida
material , esse
socialismo não
compreende, em absoluto ,
a abolição das relações
burguesas de produção - o que
só é possível
por via revolucionária – mas ,
apenas , reformas administrativas fundamentadas nessas condições
de produção e que ,
portanto , não
afetam as realizadas sobre a base
das próprias relações entre o capital
e o trabalho assalariado ,
servindo, na melhor hipóteses ,
para diminuir os gastos da burguesia
com seu
domínio e simplificar
o trabalho administrativo
de seu Estado .
O socialismo
burguês só
atinge uma expressão adequada quando se toma
uma simples figura
de retórica .
3. O Socialismo
e o Comunismo Crítico-utópicos.
As primeiras tentativas diretas do proletariado
para fazer prevalecer seus próprios interesses
de classe , feitas
numa época de efervescência
geral , no período
da derrubada da sociedade
feudal, fracassaram necessariamente não só por causa do estado embrionário do próprio proletariado , como
devido à ausência
das condições materiais
de sua emancipação ,
condições que
apenas surgem como
produto do advento
da época burguesa. A literatura
revolucionária que
acompanhava esses primeiros
movimentos do proletariado
teve forçosamente um
conteúdo reacionário .
Preconizava um ascetismo
geral e um
grosseiro igualitarismo .
Os sistemas
socialistas e comunistas
propriamente ditos , os de Saint-Simon,
Fourier, Owen, etc., aparecem no primeiro período da luta entre o proletariado
e a burguesia , período
acima descrito. (Ver
o cap. Burgueses e Proletários )
Os fundadores
desses sistemas compreendem bem o antagonismo das
classes , assim
como a ação
dos elementos dissolventes
na própria sociedade
dominante . Mas
não percebem no proletariado
nenhuma iniciativa histórica ,
nenhum movimento
político que
lhe seja próprio .
A atividade
social substituem sua
própria imaginação
pessoal ; às condições
históricas da emancipação , condições lantasistas; à organização
gradual e espontânea
do proletariado em
classe , uma organização
da sociedade pré-fabricada
por eles .
A história futura
do mundo se resume, para
eles , na propaganda
e na prática de seus
planos de organização
social .
Repelem, portanto ,
toda ação política e, sobretudo , toda ação revolucionária , procuram atingir
seu fim
por meios
pacíficos e tentam abrir
um caminho
ao novo evangelho
social pela
força do exemplo ,
por experiências
em pequena
escala que ,
naturalmente , sempre
fracassam.
A descrição
fantasista da sociedade
futura , feita
numa época em
que o proletariado ,
pouco desenvolvido
ainda , encara sua
própria posição
de um modo
fantasista , corresponde às primeiras aspirações instintivas dos operários
a uma completa transformação da sociedade .
A importância
do socialismo e do comunismo
crítico-utópicos está na razão inversa
do desenvolvimento histórico .
À medida que
a luta de classes
se acentua e toma formas
mais definidas, o fantástico
afã de abstrair-se dela, essa fantástica
oposição que
se lhe faz, perde qualquer
valor prático ,
qualquer justificação
teórica . Eis
porque , se, em
muitos aspectos ,
os fundadores desses sistemas eram revolucionários ,
as seitas formadas por
seus discípulos
são sempre
reacionárias, pois se aferram às velhas concepções de seus
mestres apesar
do ulterior desenvolvimento
histórico do proletariado .
Procuram, portanto , e nisto são conseqüentes ,
atenuar a luta
de classes e conciliar
os antagonismos . Continuam a sonhar com a realização experimental de suas
utopias sociais :
estabelecimento de falanstérios
isolados, criação de colônias no interior ,
fundação de uma pequena
Icária[12], edição
in 12 da nova Jerusalém e, para dar realidade
a todos esses
castelos no ar ,
vêem-se obrigados a apelar
para os bons sentimentos e os cofres
de filantropos , burgueses. Pouco a pouco ,
caem na categoria dos socialistas reacionários
ou conservadores
descritos acima , e só
se distinguem deles por um pedantismo mais sistemático
e uma fé supersticiosa
e fanática na eficácia
miraculosa de sua
ciência social .
Opõem-se, pois ,
encarniçadamente, a qualquer ação política da classe operária , porque , em sua opinião , tal ação só pode provir de uma cega falta de fé no novo evangelho .
Desse modo ,
os owenistas, na Inglaterra, e os owenistas, na França, reagem respectivamente contra
os cartistas e os reformistas[13]
IV - Posição
dos Comunistas Diante
dos
Diversos Partidos
de Oposição
O que
já dissemos no capítulo
II basta para
determinar a posição
dos comunistas , diante
dos partidos operários
já constituídos e, por
conseguinte , sua
posição diante
dos cartistas; na Inglaterra e dos reformadores
agrários na América do Norte .
Os comunistas
combatem pelos interesses ;
e objetivos Imediatos
da classe operária ,
mas , ao mesmo
tempo , defendem é representam, no movimento atual ,
o futuro do movimento .
Aliam-se na França ao partido
democrata-socialista[14] contra
a burguesia conservadora e radical , reservando-se o direito
de criticar as frases
e as ilusões legadas pela tradição revolucionária .
Na Suíça ,
apoiam os radicais , sem
esquecer que
esse partido
se compõe de elementos contraditórios , metade
democratas-socialistas, na acepção
francesa da palavra , metade burgueses radicais .
Na Polônia ,
os comunistas apoiam o partido que vê numa revolução
agrária a condição
da libertação nacional ,
isto é, o partido
que desencadeou a insurreição
de Crac6via em
1846.
Na Alemanha, o Partido Comunista
luta de acordo
com a burguesia ,
todas as vezes que
esta age revolucionariamente: contra a
monarquia absoluta , a propriedade rural
feudal e a pequena burguesia .
É para
a Alemanha, sobretudo , que
se volta a atenção
dos comunistas , porque
a Alemanha se encontra nas vésperas de uma revolução
burguesa; e porque realizará essa revolução nas condições
mais avançadas da civilização
européia e com um
proletariado infinitamente
mais desenvolvido
que o da Inglaterra no século XVII e o da França no século
XVIII a revolução burguesa alemã, por conseguinte ,
só poderá ser
o prelúdio imediato
de uma revolução proletária .
Os comunistas
não se rebaixa a dissimular
suas opiniões
e seus fins .
Proclamam abertamente que seus objetivos só
podem ser alcançados pela
derrubada violenta
de toda a ordem
social existente. Que
as classes dominantes
tremam à idéia de uma revolução comunista !
Os proletários nada
têm a perder nela a não
ser suas cadeias . Têm um
mundo a ganhar .
PROLETÁRIOS DE TODOS
OS PAÍSES , UNI-VOS!
[1] Escrito por
K. Marx e F. Engels em dezembro de 1847 - janeiro
de 1848. Publicado pela primeira vez em Londres, em fevereiro de 1848. Publicado de acordo
com o texto
da edição soviética
em espanhol
de 1951 traduzida da edição alemã de
1848. Confrontado com a edição Inglesa de1888, editada por
F. Engels. Traduzido do espanhol .
[2] Por burguesia
compreende-se a classe dos capitalistas
modernos , proprietários
dos meios de produção
social , que
empregam o trabalho assalariado .
Por proletários
compreende-se a classe dos trabalhadores
assalariados modernos
que , privados
de meios de produção
próprios , se vêem obrigados
a vender sua força de trabalho para poder existir .
(Nota de F. Engels à edição Inglesa de 1888).
[3] Isto é, a história
escrita . A pré-história ,
a história da organização
social que
precedeu toda a história
escrita , era ,
ainda , em
1847, quase desconhecida .
Depois , Haxthausen descobriu na Rússia a
propriedade comum
da terra , Maurer
demonstrou que esta constituía a base social de onde derivavam historicamente todas as tribos teutônicas e verificou-se, pouco
a pouco , que
a comunidade rural
com posse
coletiva da terra
era a forma primitiva da sociedade desde as Índias até
a Irlanda. Finalmente , a organização interna
desta sociedade comunista
primitiva foi desvendada em sua forma típica pela descoberta
decisiva de Morgan, que
revelou a natureza verdadeira da gens e seu lugar na tribo . Com a dissolução dessas comunidades
primitivas, começa a divisão
da sociedade em
classes diferentes
e finalmente antagônicas. Procurei analisar este processo na obra Der
Ursprung der Familie, des Privateigentums Und des Staats (A Origem da Família ,
da Propriedade Privada
e do Estado , 2ª ed.; Stuttgart, 1886). (Nota de F. Engels à edição
inglesa de 1888. Ver o terceiro
volume desta obra .
(N. da Ed. Bras.)
[4] Comunas chamavam-se na França as cidades nascentes ,
mesmo antes
de conquistar a autonomia
local e os direitos
políticos como
terceiro estado ,
libertando-se de seus amos e senhores
feudais. De modo geral .
considerou-se aqui a Inglaterra país típico do desenvolvimento econômico
da burguesia , e a França país típico de seu desenvolvimento
político . (Nota
de F. Engels à edição inglesa de 1888). Assim , os habitantes
das cidades , na Itália e na França,
chamavam suas comunidades
urbanas, uma vez comprados ou arrancados aos senhores
feudais os seus primeiros
direitos a urna
administração autônoma .
(Nota de F. Engels à edição alemã de 1890).
[5] Mais tarde
Marx demonstrou que o operário
não vende seu
trabalho , porém
sua força
de trabalho . Ver a respeito a Introdução
de Engels à obra de Marx, Trabalho
Assalariado e Capital ,
pág. 52 do presente volume
(N. da R.).
[6] Mais tarde
Marx demonstrou que o operário
não vende seu
trabalho , porém
sua força
de trabalho . Ver a respeito a Introdução
de Engels à obra de Marx, Trabalho
Assalariado e Capital ,
pág. 52 do presente volume
(N. da R.).
[8] Não se trata
da Restauração inglesa de 1660-1689. mas da francesa de 1814-1830. (Nota
de F. Engels A edição inglesa de 1888). “Jovem
Inglaterra” Círculo fundado aproximadamente em
1842 e integrado por aristocratas , políticos
e literatos do Partido
Conservador Britânico .
Seus mais
destacados representantes eram Disraeli,
Carlyle e outros (N. da R.)
[9] Isto se refere em
primeiro lugar
à Alemanha, onde os latifundiários
aristocratas e os junkers [pequena nobreza rural ]
(N. da Ed. Bras.) cultivam por conta própria grande parte de
suas terras
com ajuda
de administradores , e possuem, além disso, grandes
fábricas de açúcar
de beterraba e destilarias
de aguardente de batata .
Os mais prósperos
aristocratas britânicos
não chegaram ainda
a tanto ; porém ,
também sabem como
compensar a diminuição
de suas rendas ,
emprestando seus nomes
aos fundadores de toda
classe de sociedades
anônimas. de reputação mais ou menos duvidosa
(Nota de Engels à edição
inglesa de 1888).
[10] A tormenta
revolucionária de 1848 varreu toda essa lastimável
escola e tirou a seus
partidários qualquer
vontade de continuar
brincando de socialismo . 0 principal representante e o tipo
clássico desta escola
é o Sr. Karl Grun. [Nota de Engels A edição alemã de 1890).
[11] Na edição
inglesa de 1888, editada por F. Engels,
diz-se: Reforma penitenciária (Prison
reform) (N. da Ed. Bras.).
[12] Falanstérios eram chamadas
as colônias socialistas
projetadas por Charles
Fourier. leária era o nome dado por Cabet a seu
país utópico
e, mais tarde ,
à sua colônia
comunista na América. (Nota de F, Engels à edição
inglesa de 1888). Owen chamou suas sociedades comunistas
modelares de home-colonies (colônias no interior ).
Falanstério era o nome
dos palácios sociais
imaginados por Fourier. Chama-se Icária
o pais fantástico
cujas instituições comunistas
Cabet descreve. (Nota de F. Engels à edição alemã de 1888).
[13] Refere-se aos partidários
do jornal Le Réforme, que se editava em
Paris entre os anos
1843-1850.
[14] Este partido
era representado: no Parlamento , por
Ledru-Rollin, na literatura por
Luís Blanc, na imprensa diária por Le
Réforme. O nome , democrata-socialista,
significava, nos lábios
de seus inventores ,
a parte do partido
democrático ou
republicano que tinha
uma colorarão mais ou
menos socialista .
(Nota de F. Engels A edição inglesa de 1388). O que
então se chamava, na Franca , Partido
Democrata-Socialista era representado na
política por
Ledru-Rollin e na literatura por
Luís Blanc; estava, pois , a cem
mil léguas
de social-democracia alemã atual . (Nota de F. Engels à edição
alemã de 1890).
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