20/04/2019

Segunda Teoria do Aparelho Psíquico - (2ª tópica) – Isso, Eu, Supereu - Parte 1

Introdução
A representação “tópica” exposta no capítulo VII de “A interpretação dos sonhos” fixa a ordem de coexistência das diferentes regiões do aparelho psíquico, entre cujas extremidades – sensível e motora – se desenrolam os processos.
No entanto, em nota introduzida numa edição posterior, Freud ressalta a insuficiência do esquema anteriormente construído. “O desenvolvimento posterior deste esquema desdobrado linearmente”, escreve ele então, “deverá levar em conta esta suposição de que o sistema que sucede ao pré-consciente é aquele a que devemos atribuir a consciência”.
A primeira tópica foi inspirada pela análise do sonho e da histeria, será sucedida, após 1920, por uma segunda tópica, elaborada em resposta aos problemas da psicose, que abrange o id, o ego, e o superego. Da primeira, Freud dizia que tinha um valor descritivo, ao passo que na segunda reconhecemos um valor sistemático.
“Daremos o nome de inconsciente”, escrevia ele em 1900, “ao sistema situado mais atrás; ele não poderia ter acesso à consciência, a não ser passando pelo pré-consciente, e durante essa passagem o processo de excitação deverá se submeter a certas modificações”.
Insatisfeito com o “modelo topográfico”, porquanto esse não conseguia explicar muitos fenômenos psíquicos, em especial aqueles que emergiam na prática clínica, Freud vinha gradativamente elaborando uma nova concepção, até que, em 1920, mais precisamente a partir do importante trabalho metapsicológico “Além do princípio do prazer, ele estabeleceu de forma definitiva a sua clássica concepção do aparelho psíquico, conhecido como modelo estrutural (ou dinâmico), tendo em vista que a palavra “estrutura” significa um conjunto de elementos que separadamente tem funções específicas, porém que são indissociados entre si, interagem permanentemente e influenciam-se reciprocamente. Ou seja, diferentemente da Primeira Tópica, que sugere uma passividade, a Segunda Tópica é eminentemente ativa, dinâmica. Essa concepção estruturalista ficou cristalizada em “O ego e o id” de 1923 e consiste em uma divisão tripartite da mente em três instâncias: o id, o ego e o superego.

ISSO ou ID - Definição
Este foi um termo introduzido por Georg Groddeck em 1923 e conceituado por Sigmund Freud no mesmo ano, a partir do pronome alemão neutro da terceira pessoa do singular (Es), para designar uma das três instâncias da segunda tópica freudiana, ao lado do ego (eu) e do superego (supereu). O id (isso) é concebido como um conjunto de conteúdos de natureza pulsional e de ordem inconsciente.
Uma das três instâncias diferenciadas por Freud na sua segunda teoria do aparelho psíquico. O id constitui o polo pulsional da personalidade. Os seus conteúdos, expressão psíquica das pulsões, são inconscientes, por um lado hereditários e inatos e, por outro, recalcados e adquiridos.
Do ponto de vista “econômico”, o id é, para Freud, o reservatório inicial da energia psíquica. Do ponto de vista “dinâmico”, ele abriga e interage com as funções do ego e com os objetos, tanto os da realidade exterior, como aqueles que, introjetados, estão habitando o superego, com os quais quase sempre entra em conflito, porém, não raramente, o id estabelece alguma forma de aliança e conluio com o superego. Do ponto de vista “genérico”, são as suas diferenciações. Do ponto de vista “funcional”, ele é regido pelo princípio do prazer; logo pelo processo primário.
Do ponto de vista “topográfico”, o inconsciente, como instância psíquica, virtualmente coincide com o id, o qual é considerado o pólo psicobiológico da personalidade, fundamentalmente constituído pelas pulsões.

Histórico.
O termo das Es [isso, aquilo] é introduzido em O ego e o id (Das Ich und das Es, 1923). Freud vai buscá-lo em Georg Groddeck e cita o precedente de Nietzsche, que designaria assim “... o que há de não pessoal e, por assim dizer, de necessário por natureza do nosso ser”.
A introdução do conceito de id (isso) por Freud na teoria psicanalítica está intrinsecamente ligada à grande reformulação dos anos de 1920-1923. Sabemos que esta se caracterizou pela modificação da teoria das pulsões, pela elaboração de uma nova psicologia do ego, que levava em conta suas funções inconscientes de defesa e recalque, e pela definição de uma nova tópica, na qual o id veio a ocupar o lugar que fora do inconsciente na tópica anterior.
Foi em seu ensaio “O ego e o id” que Freud introduziu o termo pela primeira vez, insistindo na solidez de fundamento da acepção definida por Groddeck: a de uma vivência passiva do indivíduo, confrontado com forças desconhecidas e impossíveis de dominar.
A primeira tópica era uma descrição cômoda dos processos psíquicos. Permitia distinguir entre o consciente e duas modalidades de inconsciente, o inconsciente propriamente dito, cujos conteúdos só raramente (ou nunca) podiam ser transformados em pensamentos conscientes, e o pré-consciente, feito de pensamentos latentes, passíveis de se tornar ou de voltar a se tornar conscientes.
Aos poucos, a partir de 1915, ao preço de lenta maturação fundamentada na experiência clínica, Freud chegou à conclusão de que grandes partes do ego e do superego eram inconscientes.
Daí em diante, tornou-se impossível afirmar a existência de uma identidade entre o ego e o consciente, de um lado, e o recalcado e o inconsciente, de outro. Assim, foi preciso revisar por completo a concepção das relações consciente-inconsciente expressa pela primeira tópica. Daí a introdução do termo id para designar o inconsciente, considerado um reservatório pulsional desorganizado, assimilado a um verdadeiro caos, sede de “paixões indomadas” que, sem a intervenção do eu, seria um joguete de suas aspirações pulsionais e caminharia inelutavelmente para sua perdição.
Ao mesmo tempo, o ego perdeu sua autonomia pulsional, tornando-se o id a sede da pulsão de vida e da pulsão de morte. Diversamente de sua abordagem descritiva da primeira tópica, a abordagem dinâmica da segunda não instaurou nenhuma separação radical entre as instâncias que a compunham: os limites do id deixaram de ter a precisão dos que marcavam a separação entre o inconsciente e o sistema consciente-pré-consciente, e o ego deixou de ser estritamente diferenciado do id no qual o superego mergulha suas raízes.
No contexto da trigésima primeira das “Novas conferências introdutórias sobre psicanálise”, que versava sobre “A decomposição da personalidade psíquica”, Freud inaugurou uma reflexão sobre os respectivos futuros do ego e do id e sobre a missão que, sob esse ponto de vista, cabia à psicanálise. Nesse contexto, enunciou sua célebre frase “Wo Es war, soll Ich werden”, que daria margem a diversas leituras, por sua vez articulada com as modalidades de interpretação da segunda tópica. Uma primeira leitura, a da “Ego Psychology”, privilegiou o papel do eu, considerado como tendo que dominar o isso ao término de uma análise bem conduzida. Inversamente, Jacques Lacan forneceu da frase freudiana uma tradução baseada em sua teoria da linguagem. Enfatizou a emergência dos desejos inconscientes para os quais a análise deve abrir caminho, em oposição às defesas do ego, posição esta que ele recapitulou em 1967 por meio de uma formulação que se tornou famosa: “isso fala!”.

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