20/04/2019

UMA BREVE DESCRIÇÃO DA PSICANÁLISE (1924 [1923]) - Parte 2


A psicanálise, contudo, de maneira alguma se baseou nessas pesquisas de Janet. O fator decisivo, em seu caso, foi a experiência de um médico vienense, o Dr. Josef Breuer. Em 1881, independentemente de qualquer influência externa, ele pôde, com o auxílio da hipnose, estudar e restituir à saúde uma jovem muito bem dotada que sofria de histeria. Os achados de Breuer não foram comunicados ao público senão quinze anos mais tarde, após ele haver tomado por colaborador o presente autor (Freud). Esse caso de Breuer retém sua significação única para nossa compreensão das neuroses até o dia de hoje, de modo que não podemos evitar demorar-nos nele um pouco mais. É essencial compreender claramente em que consistia sua peculiaridade. A jovem caíra enferma enquanto servia de enfermeira para o pai, a quem estava ternamente ligada. Breuer pôde estabelecer que todos os seus sintomas estavam relacionados a esse período de enfermagem e podiam ser por ele explicados. Assim, pela primeira vez, tornou-se possível ganhar uma visão completa de um caso dessa enigmática neurose, e todos os seus sintomas demonstraram ter significado. Ademais, constituiu característica universal dos sintomas terem eles surgido em situações que envolviam um impulso a uma ação que, contudo, não fora levada a cabo, mas sim, por outras razões, fora suprimida. Os sintomas, de fato, haviam aparecido em lugar das ações não efetuadas. Assim, para explicar a etiologia dos sintomas histéricos, fomos levados à vida emocional do indivíduo (à afetividade) e à ação recíproca de forças mentais (à dinâmica), e, desde então, essas duas linhas de abordagem nunca mais foram abandonadas.
            As causas precipitantes dos sintomas foram comparadas por Breuer aos traumas de Charcot. Ora, constituía fato notável que todas essas causas precipitantes traumáticas e todos os impulsos mentais que delas se originavam estavam perdidos para a memória da paciente, como se jamais houvessem acontecido, ao passo que seus produtos — os sintomas — persistiam inalterados, como se, no que lhes concernia, não existisse aquilo denominado de efeito obliterador do tempo. Aqui, portanto, tínhamos uma nova prova da existência de processos mentais que eram inconscientes, mas, por essa razão, especialmente poderosos — processos que primeiro vínhamos conhecendo na sugestão pós-histórica. O procedimento terapêutico adotado por Breuer foi induzir a paciente sob hipnose a relembrar os traumas esquecidos e reagir a eles com poderosas expressões de afeto. Quando isso era feito, o sintoma, que até então tomara o lugar dessas expressões de emoção, desaparecia. Dessa maneira, um só e mesmo procedimento servia simultaneamente aos propósitos de investigar o mal e livrar-se dele, e essa conjunção fora do comum foi posteriormente conservada pela psicanálise.
            Após o presente autor, durante o começo da década de 1890, ter confirmado os resultados de Breuer em considerável número de pacientes, ambos, Breuer e Freud, decidiram conjuntamente uma publicação, Estudos sobre Histeria (1895d), que continha suas descobertas e a tentativa de uma teoria nelas baseada. Asseverava esta que os sintomas histéricos surgiam quando o afeto de um processo mental catexizado por um forte afeto era impedido pela força de ser conscientemente elaborado da maneira normal, e era assim desviado para um caminho errado. Nos casos de histeria, segundo essa teoria, o afeto passava para uma inervação somática fora do comum (‘conversão’), mas se lhe podia dar uma outra direção e ver-se livre dele (‘ab-reagido’) se a experiência fosse revivida sob hipnose. Os autores davam a esse procedimento o nome de ‘catarse’ (purgar, liberar um afeto estrangulado).
            O método catártico foi o precursor imediato da psicanálise, e, apesar de toda a ampliação da experiência e toda modificação da teoria, ainda está nela contido como seu núcleo. Ele, porém, não era mais que um novo procedimento médico para influenciar certas doenças nervosas e nada sugeria que se pudesse tornar tema para o interesse mais geral e para a contradição mais violenta.

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