20/04/2019

Sexologia – Parte 3


B) A Resolução do Conflito Edipiano
Tanto na resolução do conflito edipiano quanto na formação do Superego, no menino, dá-se algo como se fora o seguinte quadro: não há como eu ter a minha mãe só para mim, mas eu posso fazer com que uma parte dela (no caso os ideais, as inclinações, os critérios de julgamento) se torne parte de mim; assim sendo, eu a possuirei de um modo seguro.
Do meu pai, a quem amo e odeio (e por isso mesmo temo), não posso me livrar, mas para que ele não mais me venha castrar, eu vou me tornar como ele (adotando partes dos seus princípios morais e valores) e aí então ele gostará de mim e não será mais perigoso para mim. Nas meninas, a atração pelo pai é também denominada de edipiana para nós freudianos (os junguianos dizem Complexo de Electra).
A resolução da situação é muito mais complexa para a menina do que para o menino, pois este, a despeito de ter de desistir de sua ligação com a mãe, normalmente, quando maduro, vem a contrair uma ligação com uma mãe substituta, a esposa. Já a menina, que começa ligada à mãe, sente-se atraída pelo pai na fase edipiana, odeia a mãe, quer ter o pai só para si, mas acaba por desistir, compensando-se com o propósito de vir a ter um homem seu. Mas acontece que uma mulher sadia, não é capaz, como o homem, de encontrar substituição para a ligação infantil, pelo que é levada a compensar-se, propondo ela mesma a vir a ter um filho, tornar-se mãe e assim realizar uma satisfatória relação mãe-filho.

C) Caso o conflito Edipiano não seja satisfatoriamente resolvido o que pode ocorrer
A excessiva identificação com o genitor do sexo oposto pode estar associada ao desenvolvimento de características de inversão sexual no menino, ou mesmo nas meninas. O medo do genitor do sexo oposto, pode prejudicar a capacidade individual em lidar com pessoas deste sexo em fase ulterior da vida.
Um estágio edipiano parcialmente solucionado pode resultar num superego malformado ou mesmo deficiente, o qual pode vir a ser determinante de alterações sociopáticas do caráter e das neuroses.

D) Causas de uma solução não-satisfatória do Estágio Edipiano
Acesso ao período edipiano com conflitos na fase oral, ou anal, ou fálica, que são do período pré-edipiano, trazendo para o período novo, alguém sem energia suficiente para enfrentar as novas circunstâncias. A ausência de um dos genitores (sem, também, haver um substituto à altura), devido a divórcio ou qualquer outro tipo de separação.
Severa psicopatologia da parte de um dos genitores, dos tipos, por exemplo, ser um deles excessivamente sedutor, ou cruel, ou ameaçador, ou daqueles que vivem a rejeitar, ou inconsistente, ou inseguro, ou em constantes transformações, ou frio etc.
Severos defeitos no Superego, como um pai efeminado, poderão vir a serem determinantes de uma confusa identificação com tal genitor o que pode resultar numa formação superegóica instável, inconsistente e não-razoável.
Ao fim do período Edipiano, instala-se o princípio do que Freud chamou de fase genital, em que o interesse primário passa a ser a experiência genital, isto é, a tendência em vir a unir os órgãos genitais com o sexo oposto: é a atração direcionada à outra pessoa, um redirecionamento objetal, que significa a ultrapassagem da fase auto-erótica, como até então o era na última fase, fálica.

Fase de latência.
Esta é a fase que vai dos 6-12 até os 11-14 anos ou a puberdade. A característica desta fase é a repressão das fantasias e das atividades sexuais, onde os desejos e impulsos sexuais são recalcados no inconsciente. As mães costumam relatar que a partir dos 7 anos, as crianças, especialmente os meninos, ficam, mais mansinhos. Na verdade, o que ocorre é que as crianças, acessam um período de quiescência sexual.
Aqui surgem as forças anímicas, que posteriormente surgirão como entraves à pulsão sexual, estreitando seu curso semelhante a um dique (o asco, o sentimento de vergonha, as exigências dos ideais estéticos e morais). Embora a educação tenha muita a ver com a construção desses diques, tal desenvolvimento é organicamente condicionado e fixado pela hereditariedade, podendo produzir-se, no momento oportuno, independente da ajuda da educação. Esta fica inteiramente dentro do âmbito que lhe compete, ao limitar-se a seguir o que foi organicamente prefixado e imprimi-lo de maneira um pouco mais polida e profunda.
Na descrição clássica original de Freud, as manifestações sexuais são quiescentes neste período; em particular, há uma profunda repressão da masturbação, que permanece a grande tentação e problema da idade. Foi a preocupação com a masturbação e outras manifestações libidinais diretas que levou os antigos analistas a negligenciarem este período embora um fator adicional fosse a virtual ausência de crianças como pacientes.
O período de latência proporciona à criança o equipamento, em termos de desenvolvimento do ego, que a prepare para o encontro com o incremento de impulsos da puberdade. Consequentemente, ela é capaz de desviar a energia instintiva para estruturas psíquicas diferenciadas e para atividades psicossociais, em vez de ter de experimentá-la unicamente como um aumento da tensão sexual e agressiva, a que podemos denominar sublimação.
A primeira parte da latência começa dos 7 aos 8 anos aproximadamente. É caracterizada, segundo observações de Freud, pela passagem do complexo de Édipo e a formação do superego. Aqui há um primeiro caso de amor com uma criança da mesma idade ou próxima. É bastante intenso enquanto dura, depois é abandonado, após um intervalo bastante curto. A consolidação do superego e o fortalecimento dos mecanismos do ego continuam sendo interesses primordiais.
A segunda parte da latência vai dos 8 ao 11-14 anos. Caracteriza-se pela busca de colegas e a formação de grupos, tanto para meninos quanto para meninas, e por consideráveis mudanças endocrinológicas.

Fase de maturação psicossexual ou puberdade
Este período vai dos 12-15 até os 18 anos. Começa de forma súbita uma atividade endocrinológica intensa no organismo, que vai resultar numa exacerbação da libido. É a partir daí que o indivíduo retoma, de forma muita acelerada, as fases do desenvolvimento sexual, já que vem de sair da quiescência que caracteriza o Período de Latência que, na realidade, foi uma interrupção do desenvolvimento sexual intenso experimentado durante os estágios pré-edipiano e edipiano.
Observa-se nesta fase uma tendência para uma reedição dos impulsos orais, anais e fálicos e um misto de interesse sexual e de conflitos com os pais, como na fase edipiana.
Do ponto de vista sexual, é a época mais importante da vida humana, entre o nascimento e a morte, é justamente a da maturação sexual, sendo seu momento marcante pela primeira eliminação de células germinativas: primeira polução entre os garotos, e primeira ovulação ligada à menarca, entre as garotas. O que se dá, justamente na puberdade. A puberdade é uma revolução fisiológica, psíquica e sexual, que se processa de dentro para fora do organismo. O que vemos aparecer, de repente, como sexualidade psicológica, não é mais que a manifestação exterior duma atividade maior das glândulas nos recessos mais íntimos do ser. Os mesmos hormônios sexuais que formam o tipo sexual conduzem o corpo, a alma e o sexo do estado infantil à maturidade e desta a velhice, efetuando, dessa maneira, a lenta evolução e involução do organismo.
A puberdade é caracterizada por certos efeitos fisiológicos gerais: crescimento rápido do corpo e fortificação, principalmente, do esqueleto; aparição de pelos, sobretudo nas axilas e na região pubiana; e, de um modo geral, modificação da fisiologia e dos hábitos. Durante a puberdade, o crescimento das garotas se dá mais rápido, que o dos garotos, ao contrário do que se verifica nos períodos precedentes e subsequentes. As jovens de 15 anos são, em geral, maiores e mais pesadas que os rapazes da mesma idade. Em compensação, seu crescimento pára aos 20 anos, enquanto nos jovens continua até os 23.
Paralelamente ao desenvolvimento das diferenças de caracteres sexuais, provocadas sobre a constituição física e pelo instinto sexual e pela vida psíquica, a personalidade psicofísica sofre, durante a puberdade, modificações muito importantes. A consciência do Eu, aumentada ou exagerada, contrasta estranhamente com a diminuição da resistência física.
As modificações gerais, devidas à puberdade, constam desse conjunto indefinível que constitui a beleza, que é a estética feminina.
Ao nascer, tudo é desproporção e fealdade. A cabeça é enorme e desproporcionada no que se refere às outras partes do corpo procuram harmonizar-se, estabelecendo as proporções físicas humanas.
A pele da mulher, na puberdade, é fina. Pode ter, no momento das regras, uma coloração ligeiramente azulada, sobretudo nas morenas, mais notável em volta dos olhos, onde forma um círculo negro escuro.
Alguns meses antes das primeiras regras, o púbis se cobre de pelos, cuja coloração pode ser diferente da do cabelo. Depois do púbis, as axilas se cobrem por sua vez de pêlos; na maioria das ocasiões, já apareceram as regras quando se manifesta o sistema capilar nessas regiões.
Todas as glândulas da pele: glândulas sebáceas, glândulas sudoríparas, etc., se desenvolvem no momento de chegar a puberdade, produzindo, as primeiras, uma secreção sebácea, e o odor genital. Conhecemos o papel que este odor desempenha nos animais, ocasionando a procura dos sexos, isto é, o prazer sexual.
A época da transformação da criança em adolescente, varia segundo as latitudes. Pode-se admitir nesse caso, a influência do sol sobre o processo sexual. Nas regiões polares, a puberdade não se manifesta antes dos 18 anos de idade. Durante a noite polar que dura, seis meses, as mulheres da Lapônia e da Groenlândia não menstruam. Já nas regiões quentes da África, a puberdade, muitas vezes, tem início aos 8 e aos 10 anos de idade.

Não só as condições climáticas, mas as condições particulares de vida
e a própria alimentação, bem como o meio social (informações
absorvidas), podem precipitar ou retardar a puberdade.

As primeiras poluções e menstruações manifestam-se em geral, entre os 12 e 14 anos de idade. Todavia, o limite é muito largo para ambos os sexos e, dessa forma, não se deve considerar um fenômeno patológico a primeira eliminação de células germinativas, aos 17 anos. Pode-se denominar precoces os fenômenos de puberdade antes dos 10 anos, e retardados os que iniciam depois dos 18 anos.

A) Polução (Emissão Involuntária de Esperma)
O esperma é um líquido opalino-grisáceo, semitransparente, que contém o produto das glândulas seminais, isto é o espermatozoide. A composição deste alcaloide consta de matéria albuminoide, que não contém as relações da albumina nem da fibrina, mas o Esperma-tina. Esta é solúvel em água, sem que o calor a coagule. O esperma dessecado, quando em contato com a água, incha novamente. Processo utilizado para reconhecimento médico legal das manchas encontradas em lençóis, visto que, por esse processo, pode-se efetuar, no líquido obtido, o exame dos espermatozoides, único meio, no momento, de esclarecer sua natureza.
Por esfriamento podem ser encontrados no esperma pequenos cristais em forma de prismas, formados sucessivamente por cristais de fosfato de magnésio, fosfato de cal e de albumina.

B) Menstruação ou Regras
É o sangue que as mulheres perdem, a partir da puberdade, que se dá a cada mês lunar, isto é, de vinte e oito em vinte e oito dias, com maior ou menor abundância, podendo chegar a trinta dias. Entre os antigos hebreus, as mulheres eram, por lei, consideradas impuras durante o período menstrual, e tudo que por elas fosse tocado, também. Assim, elas praticamente ficavam isoladas do grupo por um período de sete dias, retornando a sua vida normal, após um cerimonial de purificação. Dado estas práticas, ainda hoje temos pessoas que semelhantemente agem – onde o contato sexual é proibido.
Por outro lado, muitas mulheres se excitam com o odor do sangue, achando o coito nesse período muito prazeroso. Outras há que se sentem mais a vontade, no ato, visto que o risco de uma gravidez indesejada é afastado nessa época. Atualmente a maioria das mulheres atravessa seus ciclos menstruais de forma quase imperceptível; realizam suas atividades normalmente. Apenas uma pequena percentagem, devido a dismenorreia, mastodinia ou cólicas menstruais, não consegue realizar seus afazeres cotidianos. Porém, por volta do décimo quarto dia do ciclo menstrual, contado do início da menstruação, é impossível passar despercebido. É o momento em que a mulher está com sua máxima carga hormonal, e o desejo sexual está no ar, sentindo intenso desejo de fazer amor, e, na maioria das vezes, não sabe como comunicar ao parceiro. Então se sente irritada, mal-humorada, sem saber precisar a causa. Na ausência de um parceiro fixo, é comum a jovem adolescente relacionar-se sexualmente com um amigo ou conhecido. É nesse período que a jovem, mesmo desejando conservar-se virgem, perde a virgindade. É também aí que ocorre a gravidez indesejada.

Fase adolescência final e adulto jovem
Neste período, a partir dos 16-18 anos e pelo resto da vida, podem ser observados os chamados pontos de fixação, que são correspondentes às fases não-solucionadas, ou pelo mesmo não satisfatoriamente solucionada, que determinam a existência de um indivíduo adulto, que passa um quadro de imaturidade em algumas áreas do seu caráter, de sua identificação sexual, de seu equilíbrio afetivo, suas tendências a regredir ante o stress, sua incapacidade de formar um relacionamento estável, suas eleições sexuais e pelas evidentes indicações de eclosão de um comportamento neurótico.

A sexualidade do idoso
O processo do envelhecimento é irreversível e contínuo, seus sintomas são: desenvolvimento e declínio. Tais processos encontram-se ligados ao longo da vida, tendo em vista que constantemente estão se formando novas células, enquanto outras são destruídas, algumas são de curta duração, como as que formam as camadas mais externas da epiderme. Como o envelhecimento é uma realidade, o importante é se preparar para um envelhecimento com qualidade, ou seja, com saúde mental, física e emocional e consequentemente uma vida sexual saudável.
Quanto a sexualidade, o que mais observamos, é um despreparo psicológico, influenciado pela cultura, cheia de tabus. Se na adolescência temos muitos preconceitos, imagine na chamada terceira idade. Não se admite ver uma pessoa idosa namorando, e, na maioria dos casos, os próprios idosos não aceitam tal ideia. Quantos são, que mesmo aos quarenta se expressam: “eu já estou velho para isso”. Isto é um absurdo, pois está provado que o ser humano, tanto o homem quanto a mulher, pode ter uma vida sexual ativa até o fim de suas vidas.

A sexualidade infantil e a Psicanálise
Na experiência e na teoria psicanalíticas, “sexualidade” não designa apenas as atividades e o prazer que dependem do funcionamento do aparelho genital, mas toda uma série de excitações e de atividades presentes desde a infância que proporcionam um prazer irredutível à satisfação de uma necessidade fisiológica fundamental (respiração, fome, função de excreção, etc.), e que se encontram a título de componentes na chamada forma normal do amor sexual.
A psicanálise confere, como sabemos, grande importância à sexualidade no desenvolvimento e na vida psíquica do ser humano. Mas não poderemos compreender esta tese sem avaliarmos, ao mesmo tempo, a transformação por que passou a noção de sexualidade. Não pretendemos aqui determinar qual a função da sexualidade na apreensão psicanalítica do homem, mas apenas precisar, quanto à sua extensão e compreensão, o uso que os psicanalistas fazem do conceito da sexualidade. Se partirmos da visão comum que define a sexualidade como instinto, isto é, como um comportamento pré-formado, característica da espécie, como um objeto (parceiro do sexo oposto) e uma meta (união dos órgãos genitais no coito) relativamente fixos, perceberá que ela só, muito imperfeitamente explica fatos fornecidos tanto pela observação direta como pela análise.
Em extensão a existência e a frequência das perversões sexuais, cujo inventario fora realizado por alguns psicopatologistas do fim do século XIX (Krafft-Ebing, Havelock Ellis), mostraram que existe grande variedade quanto à escolha de objeto sexual e quanto ao modo de atividade utilizado para obter a satisfação.
Freud estabelece que existem numerosas transições entre a sexualidade perversa e a chamada sexualidade normal: aparecimento de perversões temporárias quando a satisfação habitual se torna impossível, presença – sob a forma de atividades que preparam e acompanham o coito (prazer preliminar) – de comportamentos encontrados nas perversões, seja como substitutos, seja como condição indispensável da satisfação.
A psicanálise das neuroses mostra que os sintomas constituem realizações de desejos sexuais que se efetuam sob forma deslocada, modificada por compromissos com a defesa, etc. Por outro lado, são frequentemente desejos sexuais perversos que encontramos por detrás deste ou daquele sintoma.
Para Freud, é sobretudo a existência de uma sexualidade infantil, que atua desde o princípio da vida, que vem ampliar o campo daquilo que os psicanalistas chamam sexual. Ao falarmos de sexualidade infantil, não pretendemos reconhecer apenas a existência de excitações ou de necessidades genitais precoces, mas também de atividades aparentadas com as atividades perversas do adulto, na medida em que põem em jogo zonas corporais (zonas erógenas) que não são apenas a zonas genitais, e na medida em que buscam um prazer (sucção do polegar, por exemplo). Neste sentido, os psicanalistas falam de sexualidade oral, anal, etc.
Em compreensão, esta maior extensão do campo da sexualidade levou necessariamente Freud a procurar determinar os critérios daquilo que seria especificamente sexual nestas diversas atividades. Uma vez estabelecido que o sexual não é redutível ao genital (assim como o psiquismo não o é ao consciente), o que autoriza o psicanalista a atribuir caráter sexual a processos onde o genital está ausente? A questão se coloca essencialmente em relação à sexualidade infantil, porque no caso das perversões do adulto a excitação genital está geralmente presente.
O problema é francamente abordado por Freud, especialmente nos capítulos XX e XXI das Conferências Introdutórias sobre Psicanálise – 1915-17, onde coloca para si mesmo a seguinte objeção: “Por que haveis de teimar em já chamar sexualidade a estas manifestações da infância que sois os primeiros a considerar: indetermináveis, e, a partir das quais o sexual vai mais tarde constituir-se? Por que não dizer simplesmente, contentando-vos apenas com a descrição fisiológica, que já no lactente são observadas atividades”, como a sucção e a retenção dos excrementos, que nos mostram que a criança visa prazer de órgão.
Embora deixando a questão em aberto, Freud responde apresentando o argumento clínico segundo o qual a análise dos sintomas no adulto nos conduz a estas atividades infantis geradoras de prazer, e isto por intermédio de um material incontestavelmente sexual. Postular que as próprias atividades infantis são sexuais supõe uma operação suplementar: para Freud, aquilo que se encontra no fim de um desenvolvimento que podemos reconstituir passo a passo devia encontrar-se, pelo menos em germe, desde o início. No entanto, ele reconhece por fim que “...não estamos ainda de posse de um sinal universalmente reconhecido e que permita afirmar com certeza a natureza sexual de um processo”.
Freud declara muitas vezes que tal critério deveria ser descoberto na ordem bioquímica. Em psicanálise, tudo o que se pode postular é dada pela clínica, a qual, porém, nos mostra a sua evolução e transformações.
Vemos que a reflexão freudiana parece tropeçar numa dupla aporia referente, por um lado, à essência da sexualidade (em que a última palavra é deixada a uma hipotética definição bioquímica) e, por outro, à sua gênese, pois Freud contenta-se em postular que a sexualidade existe virtualmente desde o início.
É no que se refere à sexualidade infantil que esta dificuldade é mais patente; é aqui também que podemos encontrar indicações quanto à solução.
Já ao nível da descrição quase fisiológica do comportamento sexual infantil, Freud mostrou que a pulsão sexual se destaca a partir do funcionamento dos grandes aparelhos que garantem a conservação do organismo. Num primeiro tempo, só poderíamos referenciá-la como um a mais de prazer fornecido à margem da realização da função (prazer sentido com a sucção, além do saciar da fome). É num segundo tempo que este prazer marginal será procurado por si mesmo, para além de qualquer necessidade de alimentação, para além de qualquer prazer funcional, sem objeto exterior e de forma puramente local ao nível de uma zona erógena.
Apoio, zona erógena, auto-erotismo são para Freud as três características, estreitamente ligadas entre si, que definem a sexualidade infantil. Vemos que, quando Freud procura determinar o momento de emergência da pulsão sexual, esta surge quase como uma perversão do instinto, em que se perdem o objeto específico e a finalidade orgânica.
Numa perspectiva temporal bastante diversa, Freud insistiu muitas vezes na noção de a posteriori; novas experiências vão conferir a experiências precoces, relativamente indeterminadas, uma significação que elas não possuíam na origem. Poderemos dizer, em último caso, que as experiências infantis, a da sucção por exemplo, começam não-sexuais e que o seu caráter sexual só lhes é atribuído secundariamente, depois que aparece a atividade genital? Essa conclusão parece infirmar, na medida em que sublinha a importância do que há de retroativo na constituição da sexualidade, o que dizíamos acima da emergência desta, e a “fortiori” a perspectiva genética segundo a qual o sexual já está implicitamente presente desde a origem do desenvolvimento psicobiológico.
Essa é justamente uma das principais dificuldades da teoria freudiana na sexualidade; esta, na medida em que não é um dispositivo inteiramente montado, mas se estabelece ao longo de uma história individual que muda de aparelhos e de objetivos, não pode ser entendida exclusivamente no plano de uma gênese biológica, mas, inversamente, os fatos estabelecem que a sexualidade infantil não é uma ilusão retroativa.
Na nossa opinião, a solução para esta dificuldade poderia ser procurada na noção de fantasias originárias (ou protofantasias), que de certa maneira vêm equilibrar a de “posteriori”. Sabe-se que Freud designa assim, apelando para a “explicação filogenética” certas fantasias (cena originária, castração, sedução) que podemos encontrar em cada sujeito e que informam a sexualidade humana. Esta, portanto, não seria explicável apenas pela maturação endógena da pulsão: constituir-se-ia no seio de estruturas intersubjetivas que preexistem à sua emergência no indivíduo.
A fantasia de “cena originária” pode, no seu conteúdo, nas significações corporais que nela estão presentes, referir-se preferencialmente a determinada fase libidinal (sádico-anal), mas, na sua própria estrutura (representação e solução do enigma da concepção), não se explica, para Freud, pela simples conjunção de indícios fornecidos pela observação; constitui a variante de um “esquema” que “já está lá” para o sujeito. A outro nível estrutural, poderíamos dizer o mesmo do complexo de Édipo, definido como regendo a relação triangular entre a criança e os pais. Ora, é significativo que os psicanalistas que mais se dedicaram a descrever o jogo fantasístico imanente à sexualidade infantil (escola kleiniana) nele tenham visto em ação, muito precocemente, a estrutura edipiana.
A reserva de Freud quanto a uma concepção puramente genética e endógena da sexualidade verifica-se igualmente no papel que continuou a atribuir à sedução, uma vez reconhecida a existência de uma sexualidade infantil.
Simultaneamente ligada, pelo menos nas origens, as necessidades tradicionalmente designadas como instintos, e independente deles, simultaneamente endógena, na medida em que conhece uma linha de desenvolvimento e passa por diversas etapas, e exógena, na medida em que irrompe no sujeito a partir do mundo adulto (pois o sujeito tem que se situar de saída no universo fantasístico dos pais e recebe deles, de forma mais ou menos velada, incitamentos sexuais), a sexualidade infantil é difícil de aprender ainda pelo fato de não ser suscetível nem de uma explicação redutora que faria dela um funcionamento fisiológico, nem de uma interpretação “pelo alto”, que pretendesse que Freud descreve sob o nome de sexualidade infantil os avatares da relação de amor. Quando Freud a encontra em psicanálise é sempre sob a forma de desejo: este, ao contrário do amor, está em estreita dependência de um suporte corporal determinado e, ao contrário da necessidade, faz depender a satisfação de condições fantasísticas que determinam estritamente a escolha de objeto e a articulação da atividade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Faça seu comentário e cadastre-se no Blog!

Sobre nós

PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PROCESSOS DE PRODUÇÃO DE CELULOSE E PAPEL🎓

 O conhecimento em tecnologias de produção de celulose e papel não é transmitido em cursos de graduação em engenharia tradicionais e o propó...