20/04/2019

Sexologia – Parte 4


Os transtornos de sexualidade
Uma pessoa que tem transtornos da sexualidade, não completou o processo evolutivo normal até o ajustamento adulto saudável. A permanência da ameaça infantil inconsciente de castração pelo pai ou de separação da mãe oferece um campo aberto para o desenvolvimento desses transtornos. A tentativa de se associar fatores orgânicos ao comportamento sexual sempre acaba caindo em generalizações que tornam a hipótese falha. Níveis hormonais anormais, sinais neurológicos leves ou subclínicos, anormalidades cromossômicas e alterações inespecíficas no eletroencefalograma parecem ocorrer em alguns casos.
Na realidade, a diferenciação entre a sexualidade normal e anormal é muito tênue e sujeita a diversas influências. O comportamento sexual e as fantasias individuais são muito íntimos e só raramente chegam ao conhecimento médico. Ainda estamos distantes de detectar fatores psicológicos ou orgânicos claros para afirmar serem eles os responsáveis por qualquer comportamento específico.
Apesar do consenso de que os transtornos de identidade sexual e de preferência sexual não sejam raros e suas definições facilmente operacionalizadas, são poucos os trabalhos epidemiológicos. Talvez porque o diagnóstico não seja realizado, já que os examinadores frequentemente não questionam os pacientes sobre suas intimidades sexuais ou porque na maioria dos casos os sintomas são ego-sintônicos e os pacientes não os apresentam como queixa ou, ainda, porque são muitas vezes omitidos deliberadamente.
Mais de 50% dos transtornos de preferência sexuais se iniciam antes dos 18 anos de idade. No caso dos transtornos de identidade sexual, parece que raramente se iniciam depois dos 21 anos de idade, sendo muitas vezes relatados em crianças de três a cinco anos de idade.
A pedofilia é o transtorno de preferência sexual mais comum. Aproximadamente 15% de todas as crianças já foram molestadas antes de atingir 18 anos. A violência às crianças é sempre considerada com a maior seriedade, e os casos descobertos chegam sempre a público.
Os casos de sadomasoquismo são sempre sub-representados porque só chegam às estatísticas os casos graves com consequências legais ou policiais.
Entre os pacientes com transtorno de preferência sexual que procuram tratamento, quase 50% apresentam pedofilia, 25% queixam-se de exibicionismo e 12% de voyeurismo. A 10ª edição da Classificação dos Transtornos Mentais (CID10) da Organização Mundial de Saúde (OMS) divide os transtornos sexuais em três grupos:

Disfunção Sexual não causada por transtorno ou doença orgânica (F52)
A resposta sexual é tão intrínseca da personalidade que se torna impossível avaliar a importância relativa dos fatores psicológicos e orgânicos. Alguns tipos de disfunção (perda do interesse sexual, por exemplo) acometem homens e mulheres, embora as mulheres, mais frequentes relatem falta de prazer ou interesse.

Falta ou Perda de Desejo Sexual (f52.0)
É o problema principal e não o secundário em relação a outras dificuldades, tais como falha da ereção ou dispareunia. Embora não impossibilitando o prazer, torna a iniciativa da atividade mais difícil. É um transtorno sexual hipoativo que se expressa com frigidez. A disfunção do desejo pode ser: Total: quando nunca, em momento algum, sentem prazer no coito. Não são portadoras de libido. Parcial: quando apenas algumas poucas vezes apresentam desejo sexual. Normalmente tais mulheres dificilmente atingem o orgasmo. Circunstancial: neste caso, a disfunção de desejo está ligada a determinadas circunstâncias, a momentos, que podem ser ocasionado, pelo objeto sexual (um parceiro inadequado sexualmente), pelo local (ninho de amor inadequado), trauma ligado ao ato sexual (violência sexual, etc.), etc., permanecendo enquanto existir o problema.

Aversão Sexual e Ausência de Prazer Sexual (f52.1)
A possibilidade de relação sexual provoca fortes sentimentos negativos, suficientes para que a relação seja evitada, ou para que as respostas sexuais ocorram normalmente. O orgasmo pode ser alcançado, mas há uma falta de prazer apropriado, ao que se denomina anedonia sexual.

Falta de Resposta Genital (f52.2)
No homem é caracterizada pela disfunção na ereção no ato sexual, ocorrendo quando a ereção surge normalmente em certas situações como a masturbação ou com uma parceira diferente ou durante o sono; muito provavelmente, o fator fundamental é psicológico. Em mulheres, o problema mais frequente é o ressecamento ou falha de lubrificação vaginal, sendo que os fatores importantes podem ser psicogênicos ou infecções ou deficiências de estrogênio (frequentemente na menopausa).

Disfunção Orgástica (F52.3)
No orgasmo não ocorre ou se faz de modo muito retardado. Isso pode ser situacional (ocorre sobretudo com determinados parceiros) ou é invariável quando fatores de natureza física não podem ser excluídos. É mais comum em mulheres do que em homens. As disfunções orgásticas ou anorgasmias são classificadas em: Primária: quando a mulher nunca experimentou o orgasmo. Secundária: neste caso, a mulher tornou-se anorgástica, após ter experimentado o orgasmo. Anorgasmia Total: trata-se da popularmente conhecida frigidez, que é a incapacidade de a mulher atingir o orgasmo em qualquer situação ou momento. Anorgasmia Parcial: denomina-se anorgasmia parcial a dificuldade que a mulher tem em atingir o orgasmo, ou seja, é lenta em sua resposta orgástica. Anorgasmia Circunstancial: é o caso em que a mulher tem dificuldade de atingir o orgasmo em determinadas circunstâncias, à semelhança da disfunção de desejo circunstancial, já citada.
Podemos ainda, aqui acrescentar: o sentimento de culpa, onde muitas mulheres, por nutrirem tal sentimento ligado ao sexo, têm seus pensamentos desviados do ato; narcisismo, quando a mulher é bela vive se admirando, tão concentrada em sua beleza que não consegue se concentrar no ato sexual, antes está preocupada em não desarrumar o cabelo, quebrar a unha, etc.

Ejaculação Precoce (F52.4)
Refere-se à incapacidade de controlar a ejaculação para que ambos os parceiros possam ter orgasmo. Em muitos casos, a ejaculação pode ocorrer antes mesmo do que em homens. Esta impossibilidade só se observa geralmente no caso do coito, podendo ejacular normalmente pelo processo masturbatório. Podem ser das seguintes origens: Orgânica: diabetes, doença neurológica que interfira na sensibilidade do pênis, doenças que causem baixa de androgênio, etc. Psicológica: ocorre na maioria dos casos, sendo: a fixação à auto ereção, associada à masturbação na puberdade; fixação à fase fálica, associada à micção, gerando um medo inconsciente de punição por ejacular; um mau relacionamento conjugal; aversão inconsciente a ser pai, etc.

Vaginismo não-orgânico (F52.5)
Surge quando há espasmos dos músculos que circundam a vagina, causando oclusão da abertura vaginal. A penetração torna-se difícil e dolorosa ou mesmo impossível, no vaginismo patogênico.

Dispareunia não-orgânica (F52.6)
            Refere-se a dor durante a relação sexual, ocorrendo tanto em mulheres como em homens. Essa categoria só deve ser usada quando não há outra disfunção sexual (como vaginismo ou ressecamento vaginal).

Impulso Sexual Excessivo (F52.7)
Não costuma ser queixa de pacientes, embora possa ocorrer em mulheres e homens, sobretudo na adolescência e início da idade adulta. No homem é chamada satiríase, e na mulher, ninfomania. Quando o impulso sexual é secundário a um transtorno primário deve ser codificado.

Transtornos de identidade sexual (F64)
São relativamente raros, eles chamam a atenção devido às suas características surpreendentes, bizarras e muitas vezes inadequadas.

Transexualismo (F64.0)
É o desejo de viver e ser aceito como um membro do sexo oposto. Usualmente acompanha-se por uma sensação de desconforto ou impropriedade de seu próprio sexo anatômico. Muitas vezes, os pacientes recorrem a tratamentos hormonais e cirurgias com o objetivo de tornar o corpo congruente com o sexo preferido.

Transvestismo de duplo papel (F64.1)
Caracteriza-se pelo uso de roupas do sexo oposto durante um breve período para desfrutar a experiência temporária de ser o sexo oposto. Não há desejo de mudança de sexo ou busca de cirurgias ou hormônios.

Transtorno de identidade sexual na infância (F64.2)
É o desejo persistente e invasivo da criança de ser do sexo oposto. Acompanha-se de intensa rejeição pelo comportamento, atributos e/ou vestimentas do sexo original. Em geral, começa nos anos pré-escolares. Ocorre mais em meninos do que em meninas. Aproximadamente 70% desses indivíduos, quando adultos, mantêm orientação homossexual.

Transtornos de preferências sexuais (F65)
Têm em comum algumas características: são fantasias sexuais persistentes, repetitivas ou intrusivas; são, muitas vezes, ego-sintônicas, mas reconhecidas como pouco usuais; a excitação sexual e o orgasmo são inteiramente dependentes destas fantasias; há uma grande importância da fantasia na vida do paciente; nos casos graves há outros diagnósticos psiquiátricos associados, como transtorno de personalidade “borderline” ou psicoses.

Fetichismo (F65.0)
É a presença de dependência de alguns objetos inanimados, em geral artigos de vestuário e calçados, como estímulo para excitação e satisfação sexuais. O fetichismo só deve ser diagnosticado quando é a fonte mais importante ou única de excitação sexual.

Transvestismo Fetichista (F65.1)
É o uso de roupas do sexo oposto para obter excitação sexual. O transvestismo fetichista se distingue do transvestismo transexual por sua associação à excitação sexual, com forte desejo de tirar a roupa assim que o orgasmo acontece.

Exibicionismo (F65.2)
É uma tendência recorrente ou persistente de expor a genitália a estranhos ou às pessoas em lugares públicos, sem convite ou pretensão de um contato mais íntimo. Há excitação quando da exposição, e o ato é comumente seguido de masturbação.

Voyeurismo (F65.3)
É o comportamento, recorrente ou persistente de olhar pessoas envolvidas em comportamentos sexuais ou íntimos, tais como se despir, sem que a pessoa observada tome conhecimento. Isso leva à excitação e masturbação.

Pedofilia (F65.4)
É a preferência sexual por crianças, usualmente em idade pré-puberal ou no início da puberdade. A pedofilia, apesar de sua frequência elevada, raramente é identificada em mulheres. Freud classificou a pedofilia como sendo a perversão dos indivíduos “fracos e impotentes”. Estes se sentem atraídos por crianças por serem mais fracas e mais fáceis de conquistar quando outros objetos lhe são excluídos pela angústia.

Sadomasoquismo (F65.5)
É a preferência por atividade sexual que envolva servidão ou a inflição de dor ou humilhação. Caso o indivíduo prefira ser objeto de tal estimulação, chamamos de masoquismo; se for executor, chamamos de sadismo. Muitos indivíduos apresentam as duas características.

Transtornos Múltiplos e outros Transtornos (F65.6)
A) Necrofilia: é uma desordem sexual caracterizada pela necessidade de ato sexual com cadáveres. Está ligada a um distúrbio mental normalmente hereditário. Tem uma relação bem clara com o complexo de castração, onde a equação pode ser definida da seguinte maneira, “transar com quem já morreu, não me traz o risco de ser castrado”. Os desajustes desta ordem têm um componente neurótico mas também profundamente psicótico, onde em momentos de angústia há dissociação da realidade e o instinto impele profundamente para a necessidade de satisfação sexual com um corpo morto, que não lhe possa reagir.

B) Zoofilia: também conhecida como bestialidade, consiste na relação sexual com animais. É um distúrbio sexual encontrado principalmente em pessoas pervertidas com características de rudez, insensibilidade e grosseria, normalmente mais presente no campo, entre lavradores. Devido a transtornos neuróticos, tal pessoa vive um bloqueio afetivo para com o amor a um parceiro humano, onde a ideia presente em nível consciente expressa a crença errada de que o animal é mais adequado que o semelhante em termos sexuais.

C) Incesto: caracteriza pela prática sexual entre pessoas unidas por vínculo familiar. É normalmente resultante da mudança de objeto no período de desenvolvimento edipiano, onde ocorre um deslocamento parental fazendo com que a libido seja direcionada somente a certo membro da família, tendo mais frequência o caso entre irmãos, entre pais e filhos, e parentes próximos.

D) Gerontofilia: caracteriza-se pela preferência sexual por pessoas de idade avançada. Boa parte destes pervertidos, foi criada por pessoas ou mesmos pais idosos desde o nascimento, passando pelas fases do desenvolvimento psicossexual na companhia destes, e pelo fato de sofrerem alguma interferência, desenvolvendo a regressão a um ponto onde houve a fixação da sua sexualidade.

Tratamento dos Transtornos de Sexualidade [?]
Em geral, os transtornos de sexualidade estão associados a um prognóstico desfavorável. Entretanto, alguns fatores podem melhorar o prognóstico, como a motivação para a mudança. Entre os fatores que pioram o prognóstico incluímos: idade de início precoce, frequência elevada dos atos, ausência de culpa ou vergonha e o uso associado de drogas.
A motivação do indivíduo em buscar tratamento é o fator determinante para a obtenção de resultados favoráveis. O tratamento dos transtornos sexuais deve levar em consideração todos os fatores biológicos, psicológicos e sociais envolvidos na sexualidade. Sabemos que muitos desses transtornos têm raiz em problemas médicos subjacentes e que devem ser tratados. Muito frequentemente são fatores medicamentosos, tanto de ordem médica como psiquiátrica.
É importante acentuar que mesmo na prática da masturbação, que permite o prazer do indivíduo com o próprio corpo, faz parte do impulso sexual ser voltado dominantemente para a relação com outra pessoa de modo real ou imaginário. Esse aspecto dá à vida sexual caráter peculiar. Na vida dos casais com ligação duradoura, a satisfação sexual é fator preponderante de harmonia. A relação sexual bem-sucedida (prazerosa) dá aos parceiros um sentimento de gratidão mútua que ajuda a suportar os desgastes naturais da vida cotidiana. A insatisfação exacerba os pequenos antagonismos. É importante, por isso mesmo, estimular a boa relação entre os parceiros. Isso exige um diálogo franco sobre todos os aspectos da sexualidade. O fato de ser adulto não indica que as pessoas estão em condições de viver o sexo com liberdade. Pesa ainda sobre o sexo uma atitude preconceituosa que impede que os parceiros possam dialogar livremente sobre desejos, preferências e limites. A base desse diálogo deve ser o reconhecimento de que não existe o amante ideal. A vida sexual é uma conquista permanente que vai permitindo um conhecimento maior entre os parceiros. Os homens ainda têm dificuldades em aceitar a iniciativa das mulheres. Isso se deve ao fato de nem sempre se achar dispostos para o relacionamento sexual. As mulheres, que não têm impedimentos de natureza fisiológica, por vezes forçam uma disposição que psicologicamente não têm. Esses aspectos não são conversados entre os parceiros como deveriam. Numerosos homens ainda se julgam insuficientes por se avaliarem portadores de pênis pequeno. Na quase totalidades dos casos são atribuídas ao tamanho do pênis outras insuficiências não anatômicas.
O homem é condenado à autenticidade sexual e não consegue muitos orgasmos seguidos. As mulheres têm maior liberdade anatômica e fisiológica; são capazes de orgasmos múltiplos e podem manter relação sexual fingindo um desejo inexistente. Só a aceitação dos limites permite o diálogo franco e aberto. A vida sexual é um aprendizado em que cada parceiro precisa escutar o desejo do outro. Isso não é fácil. Desvios como a pedofilia, o fetichismo, a necrofilia, os estupros mostram a dificuldade de respeitar o parceiro e a tendência frequente de anulá-lo. É importante ter presente os limites de ordem biológica. Numerosas doenças de natureza médica estão envolvidas na disfunção da ereção. Doenças cardiovasculares, como o aneurisma da aorta e a insuficiência cardíaca; distúrbios urológicos, como o mal de Peyronie, hidrocele ou varicocele; genéticos, como a síndrome de Klinefelter; distúrbios endócrinos, como os diabetes mellitus.
Quando essas e outras condições médicas estão envolvidas, cumpre tratá-las para evitar os efeitos sobre a ereção e ejaculação.
Efeitos colaterais de várias substâncias, como os antidepressivos tricíclicos (imipramina, clomipramina, etc.), o carbonato de lítio e as anfetaminas, também podem dificultar a ereção, a ejaculação e o orgasmo. Outras drogas usadas de modo abusivo, tais como álcool, cocaína, heroína, podem comprometer a ereção e a ejaculação. Antidepressivos, como imipramina, clomipramina, nortriptilina, fluoxetina e sertralina, podem contribuir para a inibição do orgasmo feminino. Quando o sintoma aparece simultaneamente com essas medicações, importa avaliar a relação de custo e benefício das mesmas.
            Apesar de difícil, o tratamento deve ser sempre multidisciplinar, com acompanhamento médico – psiquiatra, ginecologista ou endocrinologista – psicólogos de diferentes orientações e assistentes sociais.
Há relatos de tratamentos dos transtornos sexuais com métodos psicanalíticos, comportamentais e outras técnicas diretivas. É sempre difícil acompanhar esses casos. O que sabemos é que nenhuma dessas técnicas consegue ser eficiente em todos eles. Isso deve levar a uma atitude humilde de abertura para outros tipos de investigação. A psicanálise e as psicoterapias de orientação psicanalítica são a abordagem mais comum desses problemas, apesar da escassez de estudos controlados, ajudam o paciente a entender a dinâmica psicológica dos eventos e tentar reformulá-las.
A terapia comportamental deve ser utilizada para corrigir padrões específicos de desajustamento sexual. Estímulos aversivos desagradáveis são pareados com os impulsos, que então tendem a diminuir. Técnicas cognitivas (autoconscientização, autoavaliação e auto reafirmação) e de dessensibilização sistemática também podem ser utilizadas.
O uso de medicação fica restrito a sintomas ou síndromes ansiosas ou depressivas associadas. A medicação deve ser utilizada por tempo limitado e em indicações muito precisas, apenas como um coadjuvante às psicoterapias.

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